O Bar Toca
dos Gatos abre praticamente o ano inteiro, exceto por um único dia: O dia das
Bruxas. Segunda a antiga tradição celta, o ano começaria no dia primeiro de novembro,
sendo este um dia sagrado – o dia de todos os santos. Eventualmente, o dia anterior
é considerado um dia escuro, onde seres do plano transversal sobem a
superfície. A vila dos Gatos é protegida por uma magia antiga chamada parede de
silêncio que não deixa o plano transversal passar para o plano físico. Porém,
nesse dia, as criaturas do abismo, os amorfos, conseguem ultrapassar essa
barreira e ficam perambulando pelas ruas da vila. Aquele que for pego por uma
dessas criaturas nunca mais volta a ver a luz...
...
–Akai, saia
já dessa janela! – Disse En’hain já sem paciência.
–Nyaaa! Eu
quero ver... – O gatinho fazia beicinho.
–...! –
En’hain fechou a cara.
–Tá bom...
– O gatinho estava se retirando.
De repente,
ouviu-se um barulho do lado de fora. De súbito, Akai voltou para a janela
esperando ver alguma coisa:
–BUU! – Um
ser disforme apareceu na janela.
–NYAAA!!! –
O gatinho se assustou e se escondeu debaixo de uma mesa.
–Gurei, vá
à merda, seu desgraçado! Tem nada melhor para fazer não? Assustar o pobre do
Akai desse jeito... – Gurei sai debaixo de um lençol completamente preto. –
Entre já, essas criaturas vão aparecer a qualquer momento.
–Hahaha,
você devia ter visto a cara dele. – Gurei entrou no bar. – Foi hilário...
hihihi.
–Ha-ha...
Muito engraçado... Estou rindo muito com isso... Canalha!
En’hain foi
para trás do balcão, onde limpava os copos, pensativo. Akai olhou para Gurei e
correu para trás do balcão ainda nas quatro patas:
–Nyaaa!
Lady Neko? – Perguntou Akai.
–Sim... Ela
foi ficar com o vovô gato, o Nekomata... Espero que ela fique bem...
–Que
preocupação é essa? A vaca leiteira sabe se cuidar muito bem...
–...! –
En’hain olhou para Gurei com um olhar assassino... – Não é isso...
–O que é
então? Não vai me dizer que...
–Qual é o
seu problema, hein?
–Você é
mesmo muito engraçado, haha... Você está tendo sensações esquisitas de novo! –
Gurei não se aguentava de rir.
–Vá-te
catar Gurei... – En’hain joga o copo que enxugava na cabeça de Gurei.
–Ai,
cacete! Doeu... – Gurei esfregava o galo na cabeça. – Não tinha nada mais duro
não?
En’hain
olhou novamente com seu olhar assassino e começou a apontar uma garrafa das
grandes:
–Tá bom, tá
bom... Não tá mais aqui quem falou... Sossega dragão! – En’hain apertou forte o
punho enquanto uma veia na sua testa saltava. – Vixi!
Akai ficava
meio escondido atrás do balcão, apenas com seus olhinhos e com suas orelhinhas
aparecendo. En’hain fez um cafuné nele e voltou a enxugar os copos do balcão.
Então alguém começou a bater freneticamente na porta:
–Quem será?
– Disse En’hain se dirigindo à porta.
–En’hain,
meu querido, preciso de ajuda! – Disse Lady Neko afoita.
–Espere aí,
o que foi que acontece? Porque você está assim.
–Tinha um
pequeno neko lá no templo do vovô gato... Eu não encontrei ele e o neko tava
desmaiado... eu vim correndo sem saber o que fazer...
–Quê? Não dá
para entender nada dona peituda...
–O QUE VOCÊ
DISSE?! – Lady Neko acertou aquela garrafa grande que En’hain pensava e jogar.
–Gurei tem
razão, não deu pra entender nada. Pode repetir, com mais calma dessa vez?
–Ei,
ninguém vai me ajudar não? Acabei de ser bombardeado!
–Bem, eu
cheguei ao templo e não encontrei o Senhor Nekomata. – Lady Neko se sentou num
dos bancos do balcão para se acalmar. – Não tinha ninguém lá, exceto um pequeno
neko muito bonitinho, eu me aproximei um pouco e ele desmaiou. Vim pra cá
correndo.
–Certo,
vamos até lá ver direito o que aconteceu. Akai, você vem com a gente...
–Nyaaa! – O
gatinho ficou feliz.
–Não é
segurou pra ninguém ficar sozinho... – En’hain olhou para Gurei. – Você não
vem?
–...! –
Gurei saiu andando como uma múmia, lento e todo enfaixado. – Eu tô bem, me
deixa, eu tô bem...
Durante
todo o trajeto até o templo eles ficavam juntos, tomando cuidado para não
esbarrar com nenhum amorfo. Eles estavam muito juntos:
–Desencosta,
cacete! Assim vocês me sufocam! – En’hain empurra os outros três para respirar
melhor.
–Nyaaa?! –
Fez Akai.
–Você pode
subir nas minhas costas... – Os outros dois olharam para aquela cena. – Nem
pensem nisso vocês dois! Onde já se viu...
Continuando
a caminhada, os quatro chegaram ao templo xintoísta dos nekos, um lugar típico
dessa cultura, exceto pelos grandes gatos de pedra ladeando o portal vermelho.
Cada gato levantava uma das patinhas ao lado do rosto, como quando estão
tomando seu banho de língua – os do lado direito estavam levantando a pata
esquerda e os do lado esquerdo a pata direita. As grandes árvores ornamentais
traziam pureza ao lugar, tornando aquele dia sombrio mais bonito. Dentro do
templo, encontraram o tal neko, no mesmo lugar que Lady Neko o havia deixado:
–Vejam, ele
está ali. – Lady Neko apontou para o jovem neko.
En’hain
correu para perto dele, depois de descer Akai de suas costas. Tomou seu pulso,
viu sua respiração, tinha um pouco de sangue no nariz... Concluiu que ele
apenas tinha desmaiado e que estava bem:
–Lady Neko,
o que exatamente aconteceu aqui? – Perguntou En’hain.
–Como
assim, eu estava aqui, ele desmaiou...
–Você
abraçou ele? – Indagou En’hain.
–Ahn? Acho
que sim... Isso é ruim? – Lady Neko era muito inocente.
–Já sei o
que aconteceu... Acorda vovô, eu sei que é você!
–Ta-dá! –
Uma pequena explosão de fumaça e o jovem neko se revelou o velho Nekomata da
vila. – Gostaram da transformação? Aprendi com uma velha chaleira lá no
Japão...
–Só você
mesmo, velho tapado, pra fazer uma brincadeira dessas em pleno dia das bruxas.
– Disse Gurei.
–Você devia
se envergonhar por fazer uma confusão dessas! Você devia se envergonhar!
–Eu estava
tão preocupada, vovô... – Lady Neko sentiu algo estranho lhe tocando. – Mas
agora que eu sei que o senhor está bem!
Lady Neko
deu um murro e tanto na cara do velhinho tarado:
–Eles são
lindos, eles são tão lindos... – Dizia o Nekomata, abrindo e fechando as
mãozinhas no meio do ar, com a cabeça afundada no chão, revirando os olhos.
Já que
todos estavam ali, lá ficaram. Naquele dia, não apareceu nenhum amorfo...
–Ahn? –
Disse um amorfo no meio da rua.
Foi isso...
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