quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Crônicas dos Senhores de Castelo: Fanzine - O Filho do Fim - Capítulo 12


Nina



            A pequena garota estava de volta ao seu balanço, perdida em pensamentos:
            – Vocês todos serão meus... Cada estrela do céu será minha... Vou roubar todas elas de vocês... Como roubaram meus pais de mim... – seu tom era uma mistura de tristeza e raiva.
            O Thagir vermelho abriu a porta e entrou. Ele sentia algo diferente, a menina não estava animada e seu jeito infantil lembrava o rancor de um adulto. Percebendo que o escravo estava esperando para lhe falar, ela desceu do balanço e sorriu para ele, escondendo as emoções:
            – Veja meu Thagir vermelho, o céu não está lindo hoje? – a menina fechou os olhos, como se desse por satisfeita só com os poucos raios de luminosidade que atravessaram o largo buraco no teto.
            – Mestra Nina, consegui penetrar nos arquivos da Ordem dos Senhores de Castelo...
            – E o que encontrou?
            – Eles vieram buscar a população deste planeta...
            – E o Filho do Fim? – a expressão de Nina relatava dúvida.
            – Eles não vieram por esta missão... Acredito que talvez nem saibam que ele está aqui.
            – Mentira! – a garota gritou, bufando e batendo o pé no chão. – Eles sabem que ele está aqui! Alguém mandou uma mensagem para eles pelo sistema de transmissão codificado, o Informe do Multiverso! Não tem como eles ignorarem a maior lenda que os grandes oráculos contam... A não ser...
            – Creio que sim, mestra. – o Thagir vermelho parecia estar ouvindo seus pensamentos. – Eles querem dar prioridade à população. Elas precisam urgentemente de ajuda e o Filho do Fim é um perigo... Mesmo para eles! Tanto poder em um único ser que mal sabe manipulá-los.
            – Não podemos deixar que eles ponham as mãos nele! Eles não devem matá-lo!
            – Fiquei em dúvida...
            – Eu também...
– Eles realmente seriam capazes de matar uma criança para salvar todo o multiverso?
– Se depender da alma viva da ilha, eu creio que não...
– O que eles pretendem fazer com a criança então?
– Por enquanto fiquemos com a possibilidade deles quererem apenas ficar de olho nele e protegê-lo da Irmandade. Em todo caso, se nós não ficarmos com ele, iremos avisar o Grande Irmão da invasão da Ordem dos Senhores de Castelo...
– Voltaremos a nos encontrar com eles?
– Assim que eu estiver bem disposta... Saia. – o Thagir vermelho fez uma referência e voltou pela porta de onde veio.
Em seus pensamentos, a frase inevitável estalou: “Essa menina é perigosa... Até parece adulta! Espero que o Kullat faça alguma coisa, se ele não conseguir nos tirar das garras dessa menina...”
Ele se sentou de frente a um computador e teclava ruidosamente. Os arquivos dos Senhores de Castelo disponíveis estavam sendo baixados um após o outro. O Thagir vermelho estava lendo as fichas dos castelares e reparou em algo curioso:
– Não creio! Um deles não foi admito na academia! Hahah, essa eu pago pra ver!

...

            Nina havia voltado aos seus pensamentos, mas dessa vez ela estava em sua cama, vestida com um pijama de seda branca e macia. Havia colocado vários lençóis por cima dela para evitar o frio constante. Ela tentava dormir, pensando no que poderia fazer para conseguir o que queria. Em seus sonhos, uma música distorcida tocava, ficando normal de vez em quando mostrando ser uma cantiga de ninar sem letra. A garotinha via um berço branco, minimalista, de material sintético no centro de uma sala branca de iluminação indireta forte que a fazia franzir os olhos:
            – O quarto... – ela disse. – Sempre o mesmo quarto, o mesmo lugar.
            Ela se aproximou do berço, sua intenção era ver o bebê e tirá-lo de lá, porém, algo a impedia de prosseguir e recuava. Ficou ali algum tempo, observando. O bebê começou a chorar, ela tapou os ouvidos tentando evitar que eles estourassem com o barulho ensurdecedor. Ele parou por um instante e começou a falar com ela:
            – Nina, é você?
            – Sim, estou aqui...
            – Você vai vir me buscar?
            – Estou tentando...
            – Você vai vir me buscar?
            – Eu vou...
            – Onde está a minha mãe?
            – Não sei...
            – ... – o diálogo parou.
            – Eu vou te buscar... Você me espera?
            – Quem é você?
            – Sou eu, a Nina...
            – Quem é Nina?
            – Você vai saber quando nos encontrarmos...
            – Como vou saber quem é você?
            – Eu uso vestido vermelho, terei a mesma altura que você...
            – Onde está a minha mãe?
            – ... – Nina estava triste e começou a murmurar a mesma canção de ninar que fazia barulho naquele quarto.
            A sombra dela que estava praticamente apagada com tanta luz, começou a escurecer e a luz do quarto diminuiu. O perfil que se formava na parede não era ela, era de algum animal grande e curvado, com garras e uma bocarra que permanecia aberta. Tinha cabelos desgrenhados, mãos esguias com três dedos cada e a cintura mais fina que o tronco. Algum líquido pegajoso pingava de todo o corpo e, apesar de ser apenas uma sombra, o líquido era vertido também no quarto pela parede. A imagem de Nina escureceu e foi tomada pela escuridão, ao mesmo tempo em que a sombra clareava e se tornava nítida, parando antes que se pudesse ver o rosto da criatura. O murmúrio doce e infantil tornou-se um grunhido irreconhecível. Um homem entrou na sala e começou a atirar na criatura com um pistola de projéteis metálicos que feriram gravemente a criatura da parede, sendo que quem começou a sangrar fora Nina, a sombra do monstro. A criatura gemeu de dor e agonia, praticamente chorando, descendo pela parede até o chão. O homem pega a criança e sai correndo com ela nos braços. Nina e o monstro vêem a criança ser levada e esticam, ambas, as mãos na direção da porta que se fecha. Todas as luzes terminam de se apagar, deixando uma inconsolável solidão no peito da menininha...
...

            Nina acorda. Pela janela ela vê que já está de noite e limpa o rosto das lágrimas que escorreram durante o sonho. Sua raiva foi reacendida e tomou uma decisão. Vestiu seu vestido vermelho, colocou as fitas vermelhas no cabelo dourado e foi falar com o Thagir vermelho. Ele estava cochilando na cadeira em que estava sentado, o computador já havia se desligado com a falta de operação:
            – Meu querido Thagir vermelho, acorde... – ele acordou no susto e, esfregando o rosto, bocejou e se espreguiçou.
            – Já... Mestra? – as olheiras estavam bem marcadas no rosto.
            – Sim... Vamos matar aquele maldito intrometido que está com ele.
            – Sim... – o Thagir vermelho recolocou o casaco, desligou o computador e os dois saíram. Nina estava saltitante...

...

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