segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Crônicas dos Senhores de Castelo: Fanzine - O Filho do Fim - Capítulo 30


A Besta – 1ª parte

 

            Nerítico, Pilares e Westem seguiram rumo à Cidade Baixa, mesmo não sabendo como poderiam encontrar Iksio. O galeano pensava positivo, o parceiro não se deixaria vencer por tão pouco. Ele conhecia a arthuano como ninguém, Iksio era capaz, ele sabia disso. Pilares e Nerítico não conversavam. Se entre olhavam, criando uma atmosfera pesada, evitando um ao outro.
Pilares estava constrangido pelo que acontecera com ele e tinha medo que o ultraquímico lhe desse outro sermão. Vez ou outra Pilares cometia um erro por se deixar levar pelos hábitos de ladrão, colocando os dois em apuros. O teslarniano não reclamava, sabia que estava errado e aceitava tudo calado. Tinha respeito pelo parceiro que demonstrava se importar com ele quando a maioria das pessoas o tratava mal, desprezando-o por ele ter sido um ladrão. “É normal, estou acostumado com eles. Só não entendo porque Nerítico está assim... Tenho medo de perguntar”, pensava ele, perdido em pensamentos.

Nerítico, por outro lado, não estava pensando nem um pouco nos últimos acontecimentos com os castelares. Estava pensando em Darla, no seu corpo pequeno que cabia tão bem em seus braços. Do seu jeito simples e delicado, mesmo debaixo daquela máscara grande e pesada. Sentia saudades. Queria chorar e não podia. Sabia que Darla estava morta e que não poderia fazer nada para trazê-la de volta. Karvak também estava morto. Pensou nele lembrando-o como um cunhado que o incomodaria em seu laboratório num momento crítico de uma mistura que poderia explodir se o neutralizador não fosse adicionado rapidamente. Ele sorriu, tinha certeza de que mesmo se o laboratório inteiro voasse pelos ares, Darla iria lhe pedir paciência, que ele era o irmão dela, que ele o perdoasse e ele obedeceria piamente a sua amada. O rosto de Darla poderia ser desfigurado, porém, em sua mente, ele a enxergava por inteiro, como uma mulher normal, como sua esposa... As últimas palavras lhe caíram como uma pedra no peito. A tristeza repreendida por causa da missão estava lhe causando mal.
Pilares, decidido a tomar a bronca de uma vez por todas, foi direto ao assunto:
– Nerítico, precisamos conversar. – o ultraquímico parou, olhando para Pilares.
Não aguentando, seu rosto ficou molhado. Tentava ater-se ao perigo que estava ao seu redor, buscava forças nos seus ensinamentos rígidos e calculistas. Falhou. Era como tentar se segurar numa pedra solta, ela nunca evitaria uma queda. Nerítico continuou olhando para Pilares por mais algum tempo e voltou a andar. Talvez Pilares esquecesse o que havia visto e não comentasse.
– Parceiro? O que houve? Aliás, você ainda não disse como foram os seus primeiros dias aqui...
– Por favor... – disse ele logo à frente, sem olhar pra trás. – Não me pergunte sobre isso.
– Ih... Não estou te reconhecendo, meu irmão. Você sempre é decidido em tudo. Aconteceu alguma coisa e...
– Não pergunte, Pilares. – intercedeu Westem, interrompendo o assaltante. – Não sei o que aconteceu. Mas conheço essas lágrimas, o coração dele acaba de ser partido.
– Nerítico com sentimentos? Rá! Conta outra! Nerítico nunca se deixou seduzir por nenhuma mulherzinha que fosse e agora você vai me dizer que ele, o senhor cálculo, teve o coração partido sem que eu percebesse? Não acredito!
Pilares estava tão certo do que estava dizendo que parou de olhar para o parceiro. Quando retornou a vê-lo, o rosto ainda úmido de Nerítico balançou negativamente de leve. Cabisbaixo, fechou os olhos e mais lágrimas rolaram, desconcertando Pilares.
– Mas...
– Não fale. – disse Westem. – Não fale...
...

            O silêncio que caiu sobre a relação tão antiga dos dois castelares estava pesando pelo caminho. Pilares resolveu ficar calado, tentando entender por si mesmo o que era aquilo: “Nerítico é tão certo de tudo... Como foi que ele ficou assim?”. Simplesmente não passava pela cabeça avoada de Pilares que mesmo ultraquímicos têm momentos onde precisam ficar sozinhos. Westem bem entedia aquilo, ao ver Iksio suspirando por sua Liliana dezenas de vezes.
            Enfim, com mais algumas horas de caminhada, avistaram a cidade baixa. A primeira noite havia chegado e acamparam. Com os suprimentos que conseguiram, logo fizeram uma fogueira e assaram um pouco de comida. Satisfeitos, dois deles iriam dormir enquanto um ficaria de vigia. O primeiro seria Westem.
...

            Com o meio da noite, o barulho das máquinas ao longe ficava mais sombrio. Westem ficou olhando por todos os lados, sentindo que algo se escondia por entre os entulhos:
            – Saia daí! Eu sei que você está aí! – gritou o bárbaro com ímpeto.
            Alguns pedaços de metal se moveram e Westem saiu para averiguar sem acordar os companheiros.
...

            Em seus sonhos, Pilares estava no meio de uma grande fortuna de pedras preciosas e ouro, muito ouro! Sua maior felicidade era estar ali, rodeado de riquezas brilhantes e reluzentes. Tudo ia bem até que ele caiu em um pesadelo repentino. Via a sua valiosa riqueza se dissolver aos poucos. No meio das jóias viu Nerítico dissolvendo cada uma de suas pedras, completamente ensandecido dizendo:
– Tudo pela ciência! Tudo pela ciência!
– Nerítico! Pare! Deixe um pouco pra mim! – o assaltante tentou dissuadi-lo. – Não pegue isso... Não! Isso também não!
Quando tudo havia acabado e Pilares já não tinha nada, o ultraquímico procurou por mais e só encontrou o companheiro:
 – Você serve! É justamente o que eu preciso para completar a minha experiência!
– Nerítico? Nerítico! Me deixe! – o teslarniano sentiu sua roupa sendo rasgada e acordou.
O susto fora grande, ele suava muito e podia jurar que se não tivesse acordado, sua pele seria a próxima a ser arrancada.
O ultraquímico, nascido num planeta do primeiro quadrante e que crescera em Acinki, planeta do terceiro quadrante, rico em tecnologia e famoso pelos poderosos ultraquímicos que ajudava a formar para a Ordem dos Senhores de Castelo; sonhava em como seria sua vida ao lado de Darla. Estava lá a bela moça com o rosto enfaixado para uma melhor recuperação, esperando que Nerítico lhe tivesse a honra de tirá-los para ser o primeiro a ver a reconstrução total de sua face. Os dois estavam ansiosos, esperavam que o sucesso da cirurgia selasse completamente o amor entre eles. E a última bandagem caiu:
– Nerítico? O que foi? Meu rosto não ficou bom? – Darla começou a chorar.
– ... – o Senhor de Castelo estava atônito, não conseguia dizer uma única palavras. Diante dele estava a sua amada com um rosto totalmente inesperado, feito de pano!
– Nerítico, acorda! Vai cara, acorda! Westem sumiu!
– Ahn? O quê disse Darla? – no meio da sonolência o castelar confundiu a realidade com o sonho.
– Quem é Darla? Sou eu, Pilares!
– O que você quer? – Nerítico esfregou os olhos para acordar.
– Westem sumiu! Não o vejo em lugar nenhum!
– Droga! Dimios não vai gostar disso...
– E quem se importa com isso? Westem sumiu e...
– O que foi? Porque parou? Westem apareceu?
– ...não olhe agora. Temos companhia!
Nerítico se virou e pode ver, iluminado pela luz da fogueira, um boneco de pano que lembrava um marinheiro com roupas brancas.
– Aquilo? Perdeste o juízo! Deve ser mais um brinquedo descartado pela Irmandade Cósmica...
– Ele se mexeu!
– Ahn? – o castelar olhou novamente para o boneco. – Não! É imaginação sua...
– Ele sumiu!
– ... – Nerítico já estava perdendo a paciência e olhou uma última vez, verificando que o boneco realmente havia desaparecido. – Pilares!
– O quê? Não fui eu! Eu juro! Eu estava dormindo o tempo todo, tive até um pesadelo...
– Você também? – o ultraquímico constatou os fatos, havia algo estranho acontecendo e possivelmente o boneco teria alguma coisa haver.
Nerítico sentiu algo roçando em sua perna. Olhou e viu o boneco, sentado ao seu lado. Em sua roupa, sobre o lado direito do peito, um nome bordado: Croaton...
 

Continua...



...
 

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