quinta-feira, 4 de julho de 2013

Crônicas dos Senhores de Castelo: Fanfiction - A Guerra Cósmica - Capítulo 05


PERIGOS NA AREIA

 
            No meio da travessia pelo deserto, Nina olhou para trás:
 
            — Eles se afastaram de novo, Lacroh — disse ela.
 
            — Devemos voltar? — perguntou ele, parando a moto.
 
            Corinto, transformado em pássaro, desceu voando até próximo da Gamax:
 
            — Crack! Esperem pelo grandão aqui. Crack! — disse ele grasnando.
 
            — Corinto? — exclamou Nina ao vê-lo transformado. — Que graça! Hahaha...
 
            — Algum motivo para termos que esperar? — perguntou Lacroh.
 
            — Mundergrand precisou se aliviar um pouco... — respondeu Sêminus em sua voz aguda.
 
            Ao longe, com passadas que levantavam grandes nuvens de areia, vinha o gigante correndo e, atrás dele, uma criatura que não havia sido convidada:
 
            — Corram! — gritou ele a plenos pulmões.
 
            — O que está acontecendo agora? — indagou Nina.
 
            — Pensei que eles só apareciam quando a areia ficasse muito molhada... — Lacroh observava o radar apitar. — Vamos, precisamos sair daqui ou o bicho vai pegar!
 
            O caçador acelerou, Corinto saiu voando e logo atrás ia Mundergrand, todos fugindo do verme gigante de Teslar, que em seu habitat natural alcançava incríveis velocidades, saltando pela areia e retornando em mergulhos profundos que encobriam o anelídeo completamente.
 
            — O que faremos agora? — disse Nina a Lacroh. — Eu adoraria sumir com essa coisa na zona das sombras, mas assim?
 
            — Deixe com Dantir, ele deve saber o que fazer — apesar de ouvir algum grito abafado ao fundo dizendo: “É Elians!”, Lacroh apertou um botão no painel de sua moto.
 
            O capacete da moto fez um zumbido e os alto-falantes começaram a funcionar:
 
            — Sêminus na escuta?
 
            — Sim? — uma voz grossa e viril respondeu.
 
            — Sêminus, é você?
 
            — Quem mais seria? Não vejo alma viva a quilômetros de distância!
 
            — É que a sua voz... Ah! Deixa pra lá. Pergunte a Elians o que vamos fazer. Podemos permanecer nesta corrida, mas isso vai nos fatigar rapidamente e ainda temos vários dias antes de chegar ao objetivo.
 
            — Copiado — o jiguniano bateu as pernas no metamorfo para que percebesse o sinal de voltar.
 
            — Crack! — respondeu Corinto com sons animalescos.
 
            Elians viu o metamorfo chegando e se preparou para o pouso erguendo o braço.
 
            — Não podemos continuar assim — disse o jiguniano.
 
            — Tenho um plano, mas é muito arriscado. Eu posso estar errado...
 
            — Do que precisa? — perguntou o megafísico, confiante.
 
            — Granadas atordoantes...
 
            — As escamas de sílica não conduzem eletricidade...
 
            — Eu sei...
 
            — Você é louco!
 
            — Já me disseram isso...
 
            Sêminus desceu do metamorfo e foi até o ouvido de Mundergrand:
 
            — Grandão?! Preciso da caixa na sua mão — e o giganto obedeceu.
 
            Com a caixa de experimentos disponível depois de subir na mão do castelar, vários botões foram apertados freneticamente e, ao acionar o último, várias centelhas surgiram formando um vórtice globular. Uma granada atordoante surgiu de dentro dele e foi lançada para Elians que a apanhou no ar. O príncipe de Newho mandou Corinto cuidar de Sêminus. Ele virou-se para trás e começou a contar as passadas do verme de areia.
 
            — Um... Dois... Três... Um... Dois... Três... — e se aproximou da orelha de Mundergrand. — Pode diminuir um pouco?
 
            E voltou a contar com o verme chegando mais perto:
 
            — Um... Dois... Três... Um... Dois... Três... Um... — e saltou sobre o verme que abriu largamente as fortes mandíbulas trituradoras de pedras. Lançou a granada e, em pleno ar, esticou o casaco de pele de Gorlak que, funcionando como asas, o fez planar e desviar-se da boca do verme.
 
            A granada explodiu iluminando o interior do verme. Porém, antes de adormecer, se contorceu bruscamente, golpeando Elians, que foi jogado para longe.
 
            — Dantir, não! — gritou Nina vendo o pior. — Vai Lacroh! — ela apertava fortemente os braços do caçador.
 
            — Para onde?
 
            Nina se lembrou da pouca visão do amigo:
 
            — Ele foi para a nossa direita, é só seguir que eu indico o resto — e a moto saiu numa empinada a toda velocidade.
 
            Mundergrand e os outros já haviam chegado ao corpo caído de Elians, sendo que o metamorfo já estava devidamente vestido. Nina ficou apavorada:
 
            — Elians! — e desceu correndo da Gamax que desfez o capacete imediatamente. — Acorde! Por favor, acorde!
 
            — Nina! Assim você vai matá-lo! — ponderou Lacroh ouvindo os tapas frenéticos dados pela Senhora de Castelo.
 
            — Deixe-me cuidar disso... — acudiu Sêminus que se aproximou com Corinto que carregava a caixa de experimentos.
 
            O jiguniano apertou alguns botões e um scanner verificou todo o corpo de Elians.
 
            — Ele está bem. Sofreu uma concussão na cabeça, mas não é nada grave. Ele deve ficar desacordado por enquanto.
 
            — E agora? — disse Nina vendo que não podia fazer nada.
 
            — Iremos até a caverna de cristal, como o planejado... — concluiu Lacroh, assumindo a liderança. — Lá poderemos descansar e dormir um pouco.
 
            — Nós vamos pra lá? — perguntou Corinto, confuso.
 
            — As rotas estão misturadas para despistarmos. Lembre-se, estamos aqui secretamente. Haviam três possibilidades de parada e a caverna de cristal é a mais próxima.
 
            — Entendi...
 
            — Munder! — chamou Lacroh.
 
            — Sim? — respondeu o gigante se abaixando.
 
            — Você levará Elians, tome cuidado com ele — e o giganto aproximou as mãos do chão.
 
            Nina respirou fundo, tirou um pouco da areia do rosto de Elians e o carregou nos braços sem nenhum esforço, deixando-o aos cuidados de Mundergrand. Corinto e Sêminus o acompanharam subindo na outra mão. Lacroh e Nina voltaram para a Gamax e partiram.
 

...

 
            Passados os trinta e cinco quilômetros do deserto de areia, pedras altas e lapidadas pelo vento foram surgindo. Mais resistentes e escuras, estas rochas marcam o início da região cristalina que esconde sob o solo cavernas longas e profundas com diversas formações minerais, muitas delas translúcidas e brilhantes. O local é despovoado e ninguém de Teslar se atreve a ficar ali, mesmo sendo o único oásis em quilômetros. Segundo as lendas locais, criaturas assombrosas se escondem naquelas cavernas e expulsam qualquer intruso. Dizem também que aquele que for até o fundo das cavernas encontrará um grande tesouro escondido pelos seres subterrâneos, apesar de não se saber exatamente o que é ou como são os seres que lá habitam.
 
            O grupo encontrou uma entrada subterrânea principiada por uma gruta larga e espaçosa. Mundergrand ativou o cinto de encolhimento e retornou aos dois metros de altura que comumente usava. Todos adentraram visivelmente cansados e só pararam quando encontraram sombra suficiente.
 
            Corinto, Sêminus e especialmente Mundergrand se sentaram no chão da caverna e adormeceram. Nina, ainda acordada, estava preocupada, sentindo algo no ar. Vendo que a moça não dormia, Lacroh se aproximou e tentou acalmá-la:
 
            — O Elians... — o caçador olhou para o amigo desacordado. — Ele vai ficar bem, não é nada grave.
 
            — Ahn? O quê? — a Senhora de Castelo mal ouvira o que ele dissera. — Não estou preocupada com ele!
 
            — Então, porque está tão pensativa e aparentemente preocupada?
 
            — É a sombra deste lugar, ela está dizendo alguma coisa, só não consigo entender.
 
            — Você treinou para controlar os poderes sombrios, porque não se concentra? — sugeriu.
 
            — Vou tentar...
 
Nina prostou-se juntando os braços ao corpo e uma perna na outra, fechou os olhos e tentou ouvir a voz. Os sons eram como lamurias, as lamurias se transformaram em cânticos e os cânticos eram chorosos. A castelar descreveu tudo perfeitamente e Lacroh ouvia atentamente o que ela dizia.
 
— Nina? — interrompeu ele.
 
— Droga! Estava quase entendendo!
 
— Não ouça mais o que as sombras estão tentando dizer...
 
— Como?! Por quê?! — o caçador repousou os dedos sobre a boca da moça.
 
— Nem tudo o que elas disserem deverá ser contado...
 
Num golpe rápido, ela afastou a mão dele e cerrou os olhos, encarando os dele:
 
— Você teve uma visão! — disse ela rispidamente. — Vocês videntes, porque não dizem logo tudo o que vai acontecer!
 
— Não é tão simples assim — sua voz estava séria. — Os mestres da vidência sempre aconselham que contar o presságio é fazer parte do destino, e se o destino for ruim, você é a causa do mau agouro...
 
— Nossa! Nunca te vi tão frio. Pelo visto já levou alguma bronca do seu pai...
 
— Você é sempre tão direta? — riu Lacroh. — Meu pai me alertou sobre o que eu deveria fazer com o meu dom, mas nunca me repreendeu. Ele sempre me deu autonomia para lidar com as visões. Infelizmente, elas nem sempre são boas...
 
— Espere... — Nina voltou-se para o fundo da caverna. — Tem algo lá dentro!
 
— Gamax! — chamou Lacroh se aproximando da moto. — Ative o radar.
 
O aparelho começou a rastrear e nenhum ser vivo foi detectado. O caçador estranhou:
 
— Tem certeza de que viu algo Nina?
 
— Quem tem poderes sombrios aqui? Claro que tenho certeza, eu sinto algo no escuro melhor do que quando enxergo! Eu sei que tem algo lá embaixo!
 
— Se você está dizendo...
 
— Ai! Não confia em mim?
 
— Não me leve a mal, o radar não detectou nada...
 
— Eu sei o que senti e repito, tem algo lá embaixo!
 
De repente, do fundo da escuridão, onde a luz não penetra, sons finos de algo tilintando se fizeram presentes. O som era doce e contagiante. Os dorminhocos se levantaram ainda com os olhos fechados e seguiram andando, hipnotizados. Nina e Lacroh relutaram contra as vibrações, contudo, também adormeceram e acompanharam a melodia. Todavia, o sensor de perigo da Gamax foi acionado e a máquina buzinou. Mesmo assim os sonidos só se intensificaram e os sonâmbulos prosseguiam irreversivelmente atraídos pelo chamado. A moto, num último alerta, entrou na frente do último hipnotizado impedindo que este prosseguisse. Os outros entraram no breu escuro, restando apenas o desacordado Elians sob a fraca luz.
 
            Algumas horas depois, Elias acordou. Não encontrando ninguém, ficou confuso. A moto reagiu ao seu despertar e se moveu na direção em que o grupo foi parar:
 
            — Lacroh?! Nina?! Alguém?! — não houve resposta. — O que será que aconteceu?
 
            O príncipe de Newho encostou-se na Gamax III, tentando se lembrar dos ensinamentos do multiverso.
 
            — Devemos estar na entrada das Cavernas de Cristal. Lacroh deve tê-los guiado até aqui, disso estou certo. Mas porque me deixaram sozinho? Entendo que um ou dois poderiam adentrar a caverna enquanto eu me recuperava da... Ai! — ele passou a mão na cabeça e encontrou um galo dolorido. — Pancada... Vermezinho desgraçado, tinha que aparecer naquela hora?! Quase que nos pega com as calças baixas!
 
            Perdido em pensamentos, o tilintar recomeçou, uns toques aqui, outros ali, suaves e gradativos, tentando encontrar as notas perfeitas. A Gamax imediatamente soou seu alarme de perigo, assustando Elians que entrou em modo de combate, ativando instintivamente os poderes do coração de Thandur. Seus olhos começaram a brilhar, permitindo-o visualizar as profundezas da caverna com melhor propriedade. Sacou magicamente da jóia de Landrakar uma pistola simples, de baixo calibre e fácil manuseio, mirando no escuro. Não havia nada lá, apenas as paredes da caverna e alguns cristais grossos e pontiagudos que brotavam do solo.
 
            Elians relaxou, ainda empunhando a arma se aproximou do corredor que se estreitava logo à frente. O sonido recomeçou, doce e melodioso. Sentindo que seus sentidos estavam ficando dormentes, o Senhor de Castelo retirou da jóia de Landrakar um tampão de ouvidos grande e felpudo que envolveu suas orelhas. Atipicamente, Elians era mais um guerreiro prático do que um apaixonado por armas de tiro como seu pai ou seu avô que eram pistoleiros experientes e que faziam a fama de Newho, lar dos melhores pistoleiros já conhecidos pelo multiverso. No entanto, o jovem castelar adotava práticas mais abrangentes, indo além do típico armazenamento de armas, prevendo possibilidades diversas, crendo que nem estaria preparado com ou sem elas.  Por via de regra, deveria procurar se adaptar as necessidades do planeta vigente, como se proteger das noites gélidas de Teslar ou do calor escaldante que permanece por dias a fio. A possibilidade de encontrar uma ou outro era plausível e, como necessitaria estar preparado, seguindo o conselho crucial do nono dia do grande livro dos dias, “A sorte favorece os preparados”, optou por um protetor de orelhas que pudesse inibir por um feitiço a voz de Nina lhe incomodando.
 
            Com um passo a frente, o corredor pareceu ficar mais estreito e o coração de Thandur brilhou no bracelete. Um olhar mais apurado agora revelava algo surpreendente:
 
            — Onde estão os cristais?!
 
            O castelar prosseguiu caverna adentro vigiando por todos os lados, apontando a pistola. Lembrou-se então da lenda que rondava as cavernas cristalinas:
 
            — Seria possível que...
 
Decidido, prosseguiu com a ideia. Desmaterializou, então, a pistola de volta a jóia de Landrakar e em seu lugar sacou uma espingarda de cano longo, feita de um metal grosso e vibrante. Com um leve toque da ponta da arma na parede da caverna o material especial vibrou agudamente, um som persistente e reverberante. Como previsto, os minerais reagiram ao som, se projetando com violência para fora de seus esconderijos.
 
— Pelos deuses! Cristais vivos! — gritou ele.
 
Compreendendo que foram descobertos, os cristais vibraram com intensidade. A caverna reagiu ao comando e se distorceu, fechando Elians no corredor e cortando completamente a luz que restava.
 
Em pleno escuro, Elians não se intimidou e tirou de um dos bolsos do casaco uma pequena pedra alaranjada que iluminou fracamente seu caminho, pedra esta que trazia consigo para aquecê-lo com suas propriedades do elemento fogo caso encontrasse as noites de Teslar.
 
Diante dele um caminho esquivo, incerto. Atrás dele as paredes da caverna. O que poderia acontecer ali? Ele não sabia, seria o primeiro a conhecer aquela região desconhecida:
 
            — Tenho que seguir adiante. Meus amigos podem estar correndo perigo no fundo dessa caverna... — e começou a caminhar.
 

...

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