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quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Devil's Drink 21 - Aquilo que estava previsto...


Devil’s Drink 21 – Aquilo que estava previsto...

 

            En’hain estava no telhado do bar, pensando naquilo que dissera a Gunshin quando ele acordara: “Pai”.
            – Aquele desgraçado! Como ele pode me esconder isso o tempo todo! Eu sabia que tinha alguma coisa errada entre eu e ele, eu senti isso esse tempo todo e ele não me disse! – En’hain chorava compulsivamente. – Depois de tudo, eu era apenas um substituto!
            O sentimento ruim lhe corroia o espírito. Sentindo que tudo estava para acabar, era inevitável que passasse mal, muito mal, tanto que seu lado negro lhe subiu a mente e começou a acometer-lhe alucinações:
            – Você não tem nada... Você é um inútil... Você é descartável! – a imagem de um En’hain sombrio como as trevas falava-lhe no ouvido.
            – Me deixe em paz! Eu não quero falar com você!
            – Você é meu... Eu lhe disse que o amor não existe... Eu lhe disse que a felicidade não existe... Tudo é passageiro... Eu havia lhe dito que você só tinha mais um ano para conseguir encontrar o que procurava... E agora? Encontrou? Não!
            – Cale a boca! Cale a boca! Cale a boca!!! – En’hain gritava. Quem o visse naquele momento o acharia louco por estar falando sozinho.
            – Até o final do ano... Nós já havíamos previsto e prorrogado a data por mais um ano... Agora é a sua vez, coloque fogo em tudo! Termine de uma vez com o nosso suplício... Não deixe sobrar nada! Acabe com os livros, acabe com os sonhos, acabe com o passado... Apague tudo da nossa existência...
            – Cale-se! Eu não quero que diga o que eu já sei!
            – Vamos, depois disso, tudo o que você tem que fazer é viver uma vida que não é sua, um trabalho na qual seu espírito nunca estará presente, viver uma infelicidade infinita e...
            – Não diga! Não diga! Pelo amor de Deus, não diga!
            – ...arranque esse sorriso falso que você mostra todos os dias paras as pessoas fingindo não se importar, quando na verdade você está enlouquecendo a cada momento, perdendo completamente o senso de realidade! – En’hain se movia pra frente e pra trás com as mãos nos ouvidos. Sua sanidade fora completamente embora.
            – Eu só quero que todo mundo esteja bem...
            – Bem pra quê? Seu estúpido, seu babaca, seu completo idiota! Eles não se importam com você! Cada um deles tem problemas para resolver e não podem fazer nada para te ajudar! Você precisa ser milionário para realizar os seus próprios sonhos, você é fraco, miserável, nunca vai conseguir fazer o que queremos! Você nunca vai conseguir dinheiro suficiente para produzir o que queremos...
            – Eu nunca vou conseguir abrir a caixa... – En’hain parou um pouco e se de conta disso, ficando atônito.
            – Nunca! A caixa ficará fechada para sempre! Ela engoliu as suas esperanças e mesmo que você a abra agora, nunca vai encontrar algo lá dentro! Nunca! Nunca vai haver algo lá dentro!!!
            – Eu... Eu... Eu... – a chama de vida do barman sumiu de seus olhos.
            – Sim! Foi você! Não foi mais ninguém que fez isso! Veja! Veja a prova do crime em suas mãos! – En’hain olhou paras as mãos e elas estavam vermelhas, vermelhas de sangue.
            – Eu matei... Eu matei meu pai... Eu matei o dono do bar... EU MATEI GUNSHIN! – a frase terminou com um grito.
            Na parte debaixo do bar, alguns nekos da vila dos gatos estavam se juntando ao ouvir o grande herói da vila falar sozinho e gritar que cometera um crime. Liori, o prefeito da vila, assim que ouviu sobre o que En’hain dissera foi conferir ele mesmo se era verdade. Sem preocupações, pois conhecia a força de Gunshin, o deus da guerra, ele entrou no bar. Ao sair, gritou a todos:
            – Gunshin está morto! Gunshin está morto! – o alvoroço estava dividido entre surpresa e choro. O próprio Liori, o grande leão da vila dos gatos, rugiu em sinal de tristeza, chorando amargamente pela morte do amigo.
            O vovô neko se aproximou de Liori, e começou a falar com a multidão:
            – Onde estão Gurei, Lady Neko, Sasha, Lidi’en ou Nox’en?!
            – O quê? Lady Neko não está com o senhor?! – Liori já estava enraivecido.
            – Ela havia saído a pouco do templo e ainda não encontrei a dona gos... Digo! Os funcionários do bar! – percebendo a gravidade do caso, Liori, com sua voz tremenda, ajudou o vovô a procurar pelos desaparecidos entre os nekos presentes.
            – Onde estão Gurei, Lady Neko, Nox’en e Lidi’en e o cão sarnento?! – definitivamente Liori não simpatizava com este último.
            – Alguém viu qualquer um deles? Por favor, alguém viu algum funcionário do Bar Toca dos Gatos?! – continuou o vovô.
            Os gatos de toda a pequena vila murmuravam entre si sem dar nenhuma resposta. En’hain continuava no telhado, com a personalidade completamente apagada. Sua pele, como era de costume quando estava lutando, se rasgou com os espinhos e as escamas e deu lugar ao prateado metal do corpo etéreo do draconiano:
            – Este é o fim, o fim da Toca dos Gatos... Este bar não mais existirá... – diversas bocas por todo o corpo de En’hain se abriram, mostrando os brancos dentes que traziam consigo as chamas azuis do dragão do céu que habita o interior do barman.
            A transformação não parou como das outras vezes, ela finalmente atingia o último estágio, a forma completa de dragão, com asas enormes e uma grossa cauda que de tão comprida, chegou a tocar o chão. A face de En’hain se deformara mais do que antes, o rosto liso e de poucas feições dava lugar a um semblante medonho, com uma bocarra que trituraria tudo o que caísse ali dentro. O fogo começou, a Toca dos Gatos estava completamente tomada pelas chamas incineradoras do draconiano e aumentavam a cada segundo.
            De volta ao térreo, o Vovô Neko saía de dentro do bar com a triste notícia:
            – Liori, seja forte...
            – Não!!! Ela tem de estar em outro lugar!!! – o leão branco entrou no Bar tomado pelo incêndio.
            – Por favor, escutem com atenção! – o vovô se dirigia ao povo. – Vamos para o templo, pelo menos lá a parede de silêncio poderá nos proteger deste fogo calcinante!
            As chamas estavam altas e já tomavam as árvores que estavam ao redor do bar. Os nekos corriam como podiam para se salvar, se atropelando para chegar ao templo dos gatos com algum pertence que julgavam importante. A cena era como se o lugar tivesse sido bombardeado por aviões na segunda guerra mundial.
            A casa, consumida pelas chamas, não pode mais sustentar suas estruturas e ruiu totalmente. Liori não saiu a tempo...
            En’hain murmurava algumas palavras, mesmo naquele estado inconsciente:
– Por que as coisas não foram diferentes? Por que tudo aquilo que era importante pra mim morreu em minhas mãos? Por que eu nunca consegui fazer aquilo? Por que eu nunca fui amado?! POR QUÊ?!!! – seu grito ecoava por toda a floresta do silêncio.
...

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Segunda Carta de Lady Morticia Naghtshade

Esta é a segunda carta de Morticia, em resposta a carta que enviei.


Em algum lugar de Portugal
19 de novembro de 2012

 

Faltam duas semanas para a temporada de chuva acabar, adoraria a sua visita aqui, mas pelo visto necessita muito do chip. Minha caça esta saindo de Portugal. Até parece que ele quer jogar comigo. Pena ele não saber que, quem brinca com fogo pode se queimar e tentar escapar de minhas mãos pode ser doloroso.

 

Eu poderia fazer suas vontades e desejos se realizarem, mas o chip nunca vai estar em outras mãos que não seja as minhas. Para ter as informações que ele contém, terá que brincar com fogo e se queimar. O que para você não é nenhum problema, não é?

 

Mas você esta com sorte, o que eu caço esta em direção ao Brasil e veja só, em São Paulo! O que está havendo aí para chamar a atenção da minha caça?

 

Estou de volta e espero que você saiba que isso não vai ser tão fácil.
Sabe o que eu quero!
Blood kisses.
Lady Morticia Naghtshade.

 

Obs.: e quanto ao Dri, não se preocupe, tenho algo para ele que jamais irá recusar.

 

Autografado.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Carta para Victório Anthony

Morticia Naghtshade me enviou esta carta em resposta a Devil's Drink 34


"Leiria Monte Real, 12 de novembro de 2012.

 

 Querido Victorio Anthony, não tenho boas noticias para sua caçada. Estou em uma missão em Monte Real no litoral de Portugal e não tenho previsão para voltar ao Brasil.
 Aqui esta tão frio, é época de chuva gosto desse lugar principalmente nessa época onde ocorre um fenômeno muito curioso, quarenta dias chuvosos. Só de falar arrepia a minha pele. Mas a chuva já esta em seu curso final e logo só haverá o frio e as nuvens a cobrir o céu, deveria visitar Monte Real algum dia.
 Sei que Minerva escapou das mãos do líder dos lobos, ouvi dizer que ele não teve um fim muito agradável, mas isso não pertence mais aos meus interesses. Ouvi disser que conseguiram um filho de origem pura de Minerva e ele estava com você, espero que você não tenha se apegado a ele, esse seu coração draconiano ainda sente um sentimento tão puro, tão humano. De qualquer forma, sei que pode lidar com essa situação. E espero obter mais noticias.
 O chip deve te ajudar, pois ele tem a localização de todos os Lobos, Demônios e outros seres sobrenaturais. No entanto não será tão fácil tê-lo em suas mãos, o guardo há muito tempo e não deixo que ninguém chegue até ele, é uma arma muito perigosa e sem duvida ira atrair mais seres sobrenaturais, quero algo em troca já que o meu pescoço é o que vai entrar na jogada. Eis um grande amigo, mas todo cuidado e pouco. Estou fora de encrencas com o conselho e vários outros grupos que querem meus poderes e outros atrativos dos quais você conhece muito bem. Ops! Esqueci que você ainda não os conhece, mas no fundo você os deseja.
 Quanto aos meus poderes, não se preocupe, estou ciente do perigo que corro, mas não será nem a primeira, nem a ultima vez que vejo alguém atrás de meus poderes.
 Temos assuntos a resolver querido e espero uma carta resposta.
Blood kisses.
Lady Morticia Naghtshade.
 

Obs.: talvez eu volte, mas isso vai depender de Dri, ele tem que pedir a minha volta."

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Devil’s Drink 33 – Cris...

Leia a Devil's Drink 32 primeiro!

Devil’s Drink 33 – Cris...

 

            – Cris! Cadê você! – o menino adora se esconder. – Apareça! Tenho que colocar a sua roupa! – principalmente depois do banho.
            Os dias que comecei a ficar cuidando de Cristian, filho de Minerva e reencarnação de um lobisomem albino do clã nórdico, têm sido muito movimentados.
            – Menino! Apareça! Já estou cansado de te procurar!
            Minha casa no Brasil é um pouco grande. Na verdade, nem é uma casa, está mais para uma caverna escondida no meio da mata atlântica da cidade de São Paulo – um dos poucos locais que ainda se mantém integrados à natureza naquela região urbana. O local é uma reserva de área verde e não preciso me preocupar tanto com intrusos humanos. Quem quiser me encontrar basta chamar o meu nome e, se eu estiver disponível, atenderei ao chamado. Alguns bruxos e seres sobrenaturais me conhecem, já ouviram falar do meu nome. Obviamente só de relance, não quero ser encontrado por quem não merece. Meu sangue é precioso, meus poderes mágicos estão além da expectativa e ainda posso me transformar gradativamente em dragão. Este sou eu, Victório Anthony, um draconiano que tem muito mais a demonstrar do que aparenta. E agora eu estou cuidando de uma pequena criança:
            – Cris! Merda... Cadê você!

Devil’s Drink 32 – Frio...

Leia a Devil's Drink 31 primeiro!

Devil’s Drink 32 – Frio...

 

            – Você tem certeza disso?! – eu já estava quase gritando.
            – Tenho! Victório, você não confia em mim? – a bruxinha (ela tinha uma aparência estudantil que escondia a idade) insistia no que falava.
            – Comece de novo... Não consegui entender direito... – eu estava aturdido com as palavras dela.
            – Vou tentar explicar direito... – ela pigarreou, tomou uma dose da garrafa que eu havia trazido e continuou. – O garoto que você está procurando foi levado por demônios para um centro satânico. Seus poderes são cobiçados por diversos seres sobrenaturais depois que todos souberam que foi você quem encarnou aquela criança...
            – Quem poderia ter dito uma coisa dessas! Somente eu e o tio San sabemos disso!
            – Se acalme! Aparentemente eles prezam pelo bem estar da criança e ela sobreviveu...
            – O que aconteceu?
            – O lugar em que a criança ia ser sacrificada foi tomado pelo frio e todos os que estavam no local morreram congelados... – olhava para ela com olhar inquisidor. – Juro que é verdade! Fui até o local fazer uma projeção astral para um trabalho em que fui contratada e banir as energias maléficas. Foi quando vi a criança... Nunca vi uma aura tão fria!
            – Fale! O que aconteceu a ela?!
            – Se acalme! Já está saindo fumaça da sua cabeça!
            – Desculpe... É um mal de família...
            – Bem, depois vi um ser de luz levando a criança para um orfanato de freiras...
            – Sabe o endereço?
            – Sim... Depois que soube que você procurava por um ser como o que descrevi fui checar o local exato em que o bebê estava. Tome, este é o endereço...
            – E o ‘porém’?
            – Como?
            – O ‘porém’! Sua cara me diz que você tem medo de ir lá... O que aconteceu?
            – Ah! Como eu te disse, vários seres sobrenaturais querem o poder daquele bebê. Mas não conseguem chegar perto por ser um local santo impregnado de energia protetora e pacífica. Eles não conseguem entrar e ficam fazendo tocaia para pegar a criança quando ela sair de lá...
            – Eles te perseguiram?
            – Sim... – a bruxinha tremeu sentindo calafrios. – Se eu não estivesse de vassoura a postos para voar eu seria partida em duas!

Devil’s Drink 30 – A Cidade das Pontes


Devil’s Drink 30 – A Cidade das Pontes

 

            Um mundo urbano. Prédios e edifícios por todos os lados. Pontes, dezenas de pontes, pontes por todos os lados e nenhum rio transbordando, umedecendo ou poluindo a paisagem, apenas prédios, edifícios e pontes. Não havia praças, não havia árvores, não havia plantas. Não havia animais, não havia insetos, apenas humanos viviam ali, naquele mundo cinza, triste e tenebroso.
            Nos entremeios da Cidade das Pontes, reinava a lei de ninguém. Assassinatos cometidos com crueldade e obsessão eram frequentes e nenhuma autoridade sabia o que fazer para acabar com as mortes. Eram cinco níveis distintos, que separavam a parte baixa da mais alta e não incomum era encontrar alguns trechos em que as ligações se tornavam um verdadeiro labirinto de seis níveis ou mais. Por causa desse emaranhado confuso para os próprios habitantes, tornava-se difícil pegar o serial killer que atormentava os inúteis cidadãos. Você poderia ser morto a qualquer momento, a qualquer hora, sob qualquer ponte ou acima dela. Não havia assinatura, eram apenas mortes culminadas em hábeis destrinchamentos cirúrgicos. Eram homens, mulheres, idosos e crianças... Seu apetite era tanto que fazia cerca de três vítimas por mês, uma a cada dez dias.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Devil's Drink 31 - Marcada...

Bem vindo, Antônio Dayrell. Entre e sirva-se!
Com o término da história, "Uma Vampira na Cidade" de Adriano Siqueira e Stefany Albuquerque, inevitavelmente eu, que estava ávido por todo o desenvolvimento da história, não tinha como não escrever mais uma pontinha da história. Só espero que não fique por isso mesmo, eu quero mais, mais...



Devil’s Drink 31 – Marcada...

 

            Depois de vários meses procurando, meu informante no Brasil me enviou uma mensagem para encontrá-lo numa pequena cidade do interior. Fui até o local na hora marcada:

            – Encontrou o que eu queria? – perguntei.

            – Sim. Ela está presa em um laboratório para gerar um filho e não saíra de lá até que ele venha ao mundo. Além disso, ela está muito machucada, há um bom tempo que foi marcada por forças demoníacas e as feridas custam a sarar, reabrindo de vez em quando...

            – E então?

            – Suas suspeitas estavam certas...

            – Ótimo! Pensei que nosso último encontro tivesse sido um problema, mas vejo que saiu tudo do jeito certo. O tio San vai adorar saber disso! Obrigado por tudo...

            – Não está se esquecendo de nada?

            – Calma, já estou pegando! Já estou pegando! – tirei do bolso um pergaminho com poderes mágicos e entreguei a ele. – Faça bom proveito!

            – Farei...

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Devil’s Drink 26 – Incapaz


Devil’s Drink 26 – Incapaz

 

            – Onde você estava? Espero que tenha encontrado um emprego! – este é o meu irmão mais velho, Pietro. Eu moro na casa dele, faço minhas refeições, uso a internet... Tudo sem pagar um único tostão. Eu não estudo, eu não trabalho. Aliás, acho que eu só dou trabalho. Eu deveria fazer alguma coisa para ajudá-lo, espero que eu consiga. – Ei! Está me ouvindo?

            “A minha história não deveria ser contada. Não que fosse ruim, só não é importante, a maioria das pessoas não acha importante... É o que eu penso. Eu vivo a minha vida assim, sonhando e apenas sonhando. Perdido num mundo de belas possibilidades, sem ligar para o dinheiro, sem me alimentar direito, sem ter uma vida social – nada além da virtual. E vivo nas redes sociais... Quero dizer, nem tanto, chega uma hora que elas enchem o saco e você está lá vidrado do mesmo jeito. Tenho consciência de que ficar no computador o dia inteiro sem sequer ver a luz do sol é um vício. Mas fazer o quê? Não tenho nada lá fora, eu não sei fazer nada que possa me dar dinheiro... Dinheiro, maldito seja essa desgraça que me impede de ser feliz, de fazer coisas... Argh! Isso me dá raiva!”

            – Lukas?! O que você foi fazer? – esse é o meu nome... – Você sumiu por três dias, me deixou preocupado!

            “Meu irmão... A gente nem se fala e ele insiste em cuidar de mim. Eu mal olho na cara dele. Por falar nisso, já faz um bom tempo que eu não falo nada pra ele. Que pena... Apesar de que eu tenho certeza de que não tenho nada pra dizer. Justo eu? Como poderia ter algo para dizer a ele? Talvez antes eu tivesse, eu acho. É que ele é um vendedor numa loja do nosso tio e a loja não tem tido muitas vendas ultimamente. Se as coisas não melhorarem logo podemos ficar sem a nossa casa. Eu não quero perder o lugar em que me sinto bem, que eu posso chamar de lar. Infelizmente esta casa é apenas alugada, só ficaremos aqui enquanto pagarmos em dia o que devemos e o meu irmão já está devendo dois meses. Meu irmão não quis contar nada pro nosso tio, mas também, ele nunca entenderia mesmo... Ele nunca fez nada por nós que realmente tivesse nos ajudado. Muitas vezes ele passa aqui, meio bêbado como sempre, fala um monte de besteiras, faz um monte de promessas e sai daqui sem nem saber o que fez, alimentando possibilidades que poderiam nos ajudar e que acabam por morrer, me deixando cada vez mais amargo”.

            – Lukas?! Você está me ouvindo? Seus amigos me disseram que você estava interessado em sites ilegais da internet, é verdade?

            “Amigos... É. Talvez eles sejam amigos afinal. Mesmo sem me ver eles prezam pela segurança de alguém que não estão vendo. Só tem uma coisa que eu odeio neles e no meu tio. Eles sempre dizem: ‘Você tem potencial’. O assunto morre por aí mesmo, eu odeio essa palavra. Potencial, potencial... Potencial do quê? O Brasil é um país cheio de potencial e continua na mesma merda de sempre! Meu ensino escolar foi ruim, meu ensino técnico foi mais ou menos e, quando eu pensava que o futuro de uma pessoa era ir pra faculdade, trabalhar e ter uma família, descubro que existem erros da natureza como eu que simplesmente falham e não vão pra frente. Faculdade... Esta aí um assunto que eu não tenho a mínima ideia de como lidar. Que curso eu poderia fazer? Aliás, não me preocupo com nenhuma mensalidade, me preocupo com o material, com os novos conhecimentos, com a falta de inspiração que eu poderia ter quando eu começasse a faltar e descobrisse que eu não quero mais estar lá pelo simples desgosto de ser um incompetente... É melhor que outros ocupem a vaga que eu poderia ter, pois tenho certeza de que nunca vou conseguir ter prazer em estar no meio das outras pessoas. O que me leva a questão do trabalho. Sabiam que eu já trabalhei na loja do meu tio? E um dia, quando tive um grande desgosto quando voltava do trabalho, depois te tanto tempo trabalhando lá, acabei por nunca mais aparecer na loja, sem dar nenhuma satisfação. Acho que era por que eu estava estudando ao mesmo tempo em que trabalhava, alimentando a imagem de tudo posso, tudo consigo com o dinheiro e quando ele me foi tirado por eu ter sido enganado, descobri o ser rebelde que existe dentro de mim. Fiz muita besteira naquela noite, enquanto meu irmão dormia. Desde então não falo com ele...”

            – Lukas?!!! Me diga, pelo amor de Deus o que você esteve fazendo? – tirei a mochila de um dos ombros e passei ela pra frente do corpo. Eu tinha acabado de chegar. De dentro da mochila tirei um maço de dinheiro. Eu já havia contado, eles haviam me dado dez mil pelo que eu fiz... – Da onde você tirou isso moleque?! Não me diga que entrou pro tráfico? O que nossos pais iriam pensar de você? Me diga? E o que iriam pensar de mim, por ter deixado você desaparecer desse jeito?

            “Eu acho que me importo... Eu não queria dizer pra ele, mas me importo. Das três coisas que devemos ter na vida adulta, a família com certeza é a mais importante, mesmo que você não saiba como se comportar ou lidar com ela, com outras pessoas. Não sei como esses sentimentos passam pela minha cabeça, não sei de onde eles vêm. Não queria me importar com nada, não consigo lidar com nada... Não consigo querer ter dinheiro, não consigo pensar em trabalhar, não consigo pensar no que fazer da minha vida. No entanto, insistentemente me passa pela cabeça esses pensamentos perfeitos de quando as coisas seriam simples e que tudo daria certo. Eu odeio isso. Quando penso na vida, começo a sonhar. Quando quero tornar os sonhos realidade, é justamente aí que eu vejo que as coisas não são fáceis, que você precisa se sacrificar para sobreviver e que você perdeu o ânimo, a vontade de viver, o gosto por aquilo que você fazia. Tudo fica tão insosso, um desgosto tão grande, que a única coisa em que você acaba por pensar é na morte, que a vida não tem significado nenhum...”

            – LUKAS!!! – eu desmaiei... – O que você fez?! Me fala!

            – Eu... Eu... – estava me sentindo muito fraco, o mundo estava girando.

            – Lukas!!! O que são essas bandagens na sua barriga?

            – Eu vendi o meu rim pra pagar as contas...

            – LUKAS!!!

...

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Devil's Drink 25 - Ponto de Ônibus

Bem vindo Noite Sinistra, seja bem vindo ao meu humilde bar... :)
Devil’s Drink 25 – Ponto de Ônibus

 

            Numa noite chuvosa, o jovem Samuel chegou ao ponto de ônibus depois da faculdade. Sentou-se ali embaixo e começou a pensar na vida, nas repetidas vezes em que esteve nesse ponto após ter estudado tanto. Colocou os fones de ouvidos para escutar música e relaxou. Sempre tinha um homem alto e engravatado que aparecia naquele mesmo horário, vindo provavelmente do escritório em que trabalha. Já era costume de Samuel ficar observando aquele sujeito que ficava esperando o ônibus quase dormindo de tanto cansaço. Eles tomam ônibus diferentes e nunca conversaram, mas é sempre a mesma repetição, o estudante chega e em seguida o engravatado. Naquela noite chuvosa não foi diferente e Samuel logo avistou aquele homem.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Devil's Drink 23 - Quem está faltando?

  Mais uma semana, novos clientes, espero que o atendimento esteja sendo do gosto de vocês! \o/ Então, sejam bem vindos DIO e Irineu!
  Aqui o cliente tem razão, se quiserem que eu prepare um drinque para vocês é só dizer! ^^ Vai com dedicatória e tudo, hein! :D
  Agora, aproveitem este drinque que vos ofereço, não custa nada e tem um sabor diferente do que vocês já provaram. o/
  Sirvam-se.


Devil’s Drink 23 – Quem está faltando?



            “Partes de mim?”, se perguntava En’hain, olhando os dois sujeitos que supostamente brotaram de seu corpo etéreo que normalmente se condensa de forma metálica. “Lidi’en me parece ser ouro enquanto Nox’en me lembra o bronze. Então eu devo ser a prata, com estes cabelos prateados...”
            Lidi’en, de cabelo loiro, notou a concentração exacerbada de En’hain nos dois irmãos e tentou ter alguma conversa:
            – Pensando muito em nós? – En’hain, com seu jeito meio tímido, demorou um pouco a falar.
            – Sim... – nenhuma outra frase se formou em seus pensamentos.
            – Muito difícil de entender?
            – Sim...
            – Não querendo chamar-lhe a atenção como Nox’en faria...
            – O que é que tem eu, aí? – Nox’en não notou a conversa dos dois, mas ouviu perfeitamente o seu nome ser chamado.
            – Ignore-o... Continuando. Não querendo chamar-lhe a atenção indevidamente, mas, você só vai ficar me dizendo sim o tempo todo?
            – ... – En’hain ficou pensando, sem dizer nada, ainda com o olhar vago.
            Nox’en, por sua vez, não se importava com o que estava acontecendo, preferia brincar com as garrafas do bar, fazendo malabarismos, do que cuidar dos afazeres. Lidi’en acabou por se irritar novamente com ele:
            – Nox’en... – disse secamente.
            – O quê?
            – Nox’en...
            – Fala!
            – Nox’en! – acabou gritando.
            – Merda! – o novo barman acabou derrubando uma das garrafas que acabou quebrando. – Por que você gritou comigo... De novo?!
            – Você não para de brincar com as garrafas.
            – E daí? Faz parte do show que eu vou fazer hoje à noite... Estou apenas treinando.
            – Infelizmente, meu irmão, temos que organizar tudo para atender a clientela antes do expediente começar. – ponderou Lidi’en.
            – Palhaço... Precisava me assustar? Ei, você?! – Nox’en se dirigiu a En’hain.
            – Eu?
            – Acorda pra vida, seu zumbi, vai lá atrás pegar a pá e a vassoura pra mim!
            – Nox’en! – gritou Lidi’en novamente.
            – O que é?! – bufou o barman atrás do balcão.
            – Ao menos peça, por favor!
            – ...! – Nox’en cerrou os olhos, rancorosamente. Respirou fundo e pediu. – Poderia, por favor, pegar a pá e a vassoura?
            – ... – En’hain olhava para o vazio sem responder nada.
            – Acorda molenga! – gritou ele.
            – Elas estão atrás de você...
            – Mas, hein? – Nox’en olhou para trás e realmente a pá e a vassoura estavam ali, perto dele. – Ué? Eu jurava que eles estavam lá atrás, na cozinha... Bom, que seja. Foi mal, aí...
            – ... – En’hain ficou novamente calado.
            Lidi’en ficou atento com o que aconteceu. Ele também sabia que a vassoura e a pá não estavam ali...
...

            En’hain estava do lado de fora do bar, no jardim posterior a entrada, pensando na vida, isto é, se algum pensamento pleno lhe ocorresse. Ele ouviu a conversa de Gurei, Lady Neko e Sasha que estavam chegando do mercado com as compras do dia:
            – Eu querer osso! – disse Sasha, o lobisomem.
            – Não dou! Heheh... – Gurei estava brincando com seu amigo como sempre fazia, tratando-o como um simples animal.
            – Gurei, pare com isso, você sabe como isso irrita o En’hain. Não trate o Sasha desse jeito. – disse Lady Neko.
            – Ah, mas olha a cara dele. É irresistível fazer isso com ele! – Gurei sorria, por estar se divertindo tanto.
            O draconiano de prata estava em seus pensamentos, finalmente ele conseguiu lembrar-se de alguma coisa, uma imagem. Lá estava ele, feliz por terminar mais um dia de expediente. Estavam lá o Gurei, o Sasha, a Lady Neko e seu marido, o prefeito da vila, Liori. Tinha também o Vovô Neko, do templo xintoísta da vila, que insistia em ficar de olho nos fartos seios da esposa do prefeito. En’hain sorriu e sentiu um peso nas costas. Colocou as mãos lá e não tinha nada, faltava alguma coisa... Entrou correndo no bar:
            – Onde ele está?! – sua voz estava desesperada. – Eu quero saber, onde ele está?!
            Lidi’en e Nox’en não sabiam do que ele estava falando:
            – Opa! Começou a falar? O que foi, o que aconteceu? – perguntou Nox’en.
            – Nox... Ele deve estar falando daquilo que o Gunshin falou.
            – Ih! Então ele vai surtar de novo?
            – Onde ele está?! – gritou En’hain.
            – Não sabemos, está bem?! – gritou Gurei, sem dirigir o olhar.
            – Quem é ele? – a respiração de En’hain estava difícil. – Quem é ele? Por que eu não consigo me lembrar dele?
            – Ele se foi... – Lady Neko também estava triste.
            – Quem é ele?!!! – En’hain gritava desesperado.
            – Não sabemos! – Gurei estava mais exaltado ainda. – Ele deve ter atravessado a parede de silêncio...
            – Não, não, não... – En’hain caiu de joelhos, aos prantos. – Quem é ele?!!!
            – Acalme-se, por favor. – interveio Lidi’en.
            O frágil estado de En’hain piorou e ele acabou desmaiando. Junto com sua queda, algumas garrafas do bar simplesmente explodiram, enquanto as portas e janelas ficaram batendo violentamente:
            – Não disse? – falou Nox’en.
            – Acho que isso vai ser um problema... – disse Gunshin aparecendo de repente.
            – Por que um problema? Nem sabemos por que ele está assim – disse Lidi’en.
            – Perder alguém é uma coisa, lembrar sempre dela sem saber quem é pode te enlouquecer... Esse é um dos piores efeitos da parede de silêncio.
            – Gunshin, não tem como ajudar o En’hain? – pediu Gurei, encarecidamente.
            – Não... É assim que a parede de silêncio protege os nekos da vila há tanto tempo. Os homens gato sempre foram seres humilhados das mais terríveis formas pelos humanos, o mago que fez esse encanto queria garantir que tudo fosse esquecido e sumiu, sem deixar nenhuma pista de como desfazer a parede de silêncio. Sinto muito...
            – Ele vai? – perguntou Lidi’en.
            – Sim... Ele já está fraco demais. Se o neko de ligação dele não voltar, a instabilidade de sua forma etérea irá sucumbir, levando consigo seu corpo de carne...
            – Seu inútil! – gritou Gurei, cheio de raiva. – Você o deixa sozinho nesse lugar cheio de pesadelos para os humanos como se fosse fácil e some sempre que ele precisa de você!
            – Foi ele que foi me buscar...
            – ...! – todos se assustaram com as palavras de Gunshin.
            – E então?! Porque ele não veio com você? – Gurei exigiu uma resposta.
            – Não sei... – Gunshin pegou En’hain nos braços, e o levou para cima. Os outros ficaram calados.

...

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Devil’s Drink 22 – Eles...

Bem vindos os novos clientes Nanda Roque e Sérgio Carmach! Obrigado por integrarem a clientela deste humilde Bar! ^^
Ah, e um obrigado especial ao Ulisses Góes, também cliente do bar, por causa dele, as ondas de rádio estão me deixando sem dormir de noite... ^^'
E aos autores originais de Crônicas dos Senhores de Castelo, G. Brasman e G. Norris, por terem criado o personagem Iki-Dao no segundo livro - Efeito Manticore. Me identifiquei muito com ele, com sua dualidade de pensamento entre os irmãos. Então acabou saindo esse drinque... Divirtam-se! \o/
Devil’s Drink 22 – Eles...



            Dor de cabeça... As dores eram fortes, En’hain as sentia latejando, praticamente explodindo sua cabeça. O barman estava zonzo, talvez por que ele tenha dormido durante três dias. Mas provavelmente era por outro motivo. Ele não sabia o que fazer e foi descendo as escadas lentamente, quem sabe alguém reparasse nele e o ajudasse. Ficou ali, olhando o movimento do bar, poucos degraus abaixo do topo da última escada. Olhava para todos os lados, não conseguia ver direito. Sua miopia havia voltado.

            En’hain tentou escutar e ouviu a voz de Gurei, o neko de pelos cinza-azulados e tapa-olho no rosto que tanto o irritava. O tom de voz parecia diferente, ele estava rindo:

            – Não acredito! É sério?!

            – Seríssimo! – uma voz forte e desconhecida falou.

            “Será que tem alguém novo no bar?”, pensou En’hain, que acabou percebendo outra coisa: “Será que eu fui substit...” A palavra morreu em seus pensamentos diante do choque.

            – Ele não tem a mínima noção do que está fazendo aqui! – continuo a voz estranha.

            – Ele é patético assim mesmo. Se bem que agora ele não está mais parecendo o que era... – Gurei ficou pensativo por alguns instantes. – Não! Que ele se foda! – disse com deboche.

            “De quem eles estão falando? Quem é esse outro?!”, continuava a pensar.

            E a conversa prosseguia:

            – Então Nox’en, me conta mais sobre os podres do dorminhoco... – En’hain sentiu sua espinha gelar e sua garganta travar, engolindo a seco.

            – Vocês dois, calem a boca! Já estão me enchendo! En’hain isso, En’hain aquilo... Vocês não tem nada melhor pra fazer! – disso uma terceira voz, também desconhecida.

            – Tinha mais isso aí... – falou o tal Nox’en.

            – É mesmo! Hahah... Ele sempre faz desse jeito quando está com raiva.

            – Por que vocês estar falando assim de En’hain? – disse Sasha, o lobisomem da casa.

            – Esses dois estão se divertindo à custa dele que ainda está dormindo... – disse o segundo desconhecido.

            – Medíocres...  Eles são medíocres!– retornou a falar o primeiro em tom de discurso.

            – Hahaha... Se eu soubesse que você tinha um lado desses, eu teria te levado pra beber mais cedo. – Gurei ria tanto que não se aguentava. – Hahahah...

            – ...! – o segundo sujeito fez alguma coisa que tilintou um barulho metálico.

            – Ei! Larga essa faca! Me deixa em paz Lidi’en! – o primeiro estranho devia estar fugindo do outro.

            – Não fale mais assim dele! – En’hain ouviu o barulho da faca sendo cravada na parede.

            “Quem é esse que quer me defender desse jeito?”, no seu canto, os pensamentos de En’hain fluíam confusamente. Afinal, eles estavam falando mal ou bem dele? Ele ficou ali, ouvindo mais da conversa:

            – Rapazes! – era Lady Neko que falava agora. – Não briguem, vocês mal chegaram e já querem causar problemas?

            – Foi ele que me irritou, Lady Neko! Esse imbecil sem cérebro que não sabe o que faz e fica ridicularizando os outros... – seu tom era áspero e rancoroso.

            – E eu tenho culpa dele ser tão ridículo?

            – Aiai... Será possível que vocês não conseguem chegar a um acordo?

            – NÃO! – disseram os dois ao mesmo tempo.

            – Nossa... – Lady Neko, com toda a sua delicadeza, se sentiu acuada pela agressividade dos desconhecidos... E deu um belo tapa nos dois.

            – Brutamonte! – gritou Nox’en, enraivecido.

            – Por quanto tempo isso vai continuar? – disse Lidi’en, se acalmando.

            – Até você! Essa eu não esperava... – Nox’en estava contrariado.

            En’hain também se fez essa mesma pergunta e, em seguida, sua cabeça voltou a latejar. As dores foram fortes e ele desmaiou, caindo escada abaixo, assustando todo mundo:

            – En’hain?!

...

            Era de dia, pela manhã. En’hain sabia disso por que nesse horário os raios de sol batem diretamente na cabeceira da cama do senhor Gunshin:

            – Ele devia mandar fazer uma persiana...

            – Depois eu faço... Você está melhor?

            – ... – En’hain franziu os olhos tentando enxergar, fazendo cara feia por saber que era o sumido que estava ali. – Acho que estou...

            – Tome, aqui estão os seus óculos.

            – Obrigado... – finalmente ele conseguiu voltar a enxergar, ficando calado encarando o dono do bar.

            – Você já sabe?

            – Que fui substituído? Eu fiquei ouvindo os dois sujeitos ontem conversando com o pessoal como se eu já estivesse morto. – suas palavras eram pesadas por causa do ressentimento. – Eu pensei que finalmente tivesse encontrado um lugar onde eu deixasse de ser inútil. E tão logo eu passo mal já sou substituído...

            – En’hain?!

            – O que foi? Você já fez as minhas malas, não foi?! Estou ficando de saco cheio de tudo isso aqui, de não fazer parte disso... – ele encostou a cabeça em cima dos joelhos que estavam próximos ao corpo e virou-a para o outro lado, chorando.

            – Rapazes, entrem logo, antes que ele piore! – gritou Gunshin para os outros que estavam do lado de fora.

            En’hain estava curioso, quem eram aqueles que o substituíram? Ele virou o rosto para olhar e viu dois homens, de estatura mediana como a sua e que tinham exatamente a mesma altura. Pareciam gêmeos, porém, eram diferentes. Um tinha cabelo amarelo loiro perfeitamente penteado, olhos vermelhos, usava um avental do bar sobre uma roupa simples, uma camiseta e uma calça jeans azul que En’hain reconheceu como suas, do dia em que ele chegou ao bar. Sua expressão era como se quisesse pedir desculpas, sem coragem para dizer nada. O outro estava irrequieto, como se estivesse com raiva. Ele tinha cabelo castanho alaranjado, lembrando a cor do cobre polido, espetados para cima; usava um casacão de frio, o mesmo que Gunshin usara na noite de inverno do seu encontro com En’hain; por debaixo ele tinha o uniforme de barman da Toca dos Gatos – camisa branca, calça e colete pretos com uma gravata borboleta na cor vermelha. O primeiro decidiu quebrar o silêncio e começou a falar:

            – Eu sou Lidi’en... E esse é o Nox’en... – enquanto ele tentava encontrar as palavras certas, o outro simplesmente levantou a mão para dar um oi, sem dirigir a atenção. – Nós somos... O que nós somos mesmo Gunshin?

            – Personas interiores...

            – Sim, isso mesmo... Eu e Nox’en...

            – O burro vai na frente... – interrompeu o irmão.

            – Vai começar de novo?! Nem na frente dele você vai ser mais educado?

            – Não é você que gosta de ser educado? Então, eu quis dizer que o certo é você falar sobre você por último...

            – Eu só me complico... – Lidi’en colocou a mãos na frente do rosto, apertando as têmporas. – Então... Nox’en e eu...

            – Agora sim!

            – Pare de me interromper, caramba!

            – Eu não sou caramba! – os dois não paravam de discutir.

            – O que é uma persona interior, Gunshin? – perguntou En’hain, mais confuso do que nunca.

            – São partes de você...

            – Como assim?

            – Eles saíram de você...

            Gurei gritou do lado de fora do quarto:

            – Parabéns... Mamãe! – ele ria descontroladamente, chegando a chorar.

            – ...! – En’hain ficou sem palavras...

            – Você não é mais o último draconiano da Terra... – completou Gunshin, que batia levemente em seu ombro.

            – Por que comigo?! – ele não sabia o que fazer e começou a rir e chorar ao mesmo tempo... – Por quê?!!!

...

terça-feira, 17 de julho de 2012

Devil's Drink 20 - A Caixa


A Caixa



            Um marceneiro. Um homem de vinte e poucos anos que mal sabe manipular as grandes máquinas cortadoras, mas que aprendeu a fazer algumas coisas com a madeira encontrada na rua, que qualquer um acha melhor descartar por não ter mais utilidade e que ele simplesmente as torna útil de novo. Fazer caixas é o que ele mais faz. Não que ele goste, é o que os outros, os familiares pedem que ele faça... de graça. Ele não sabe se eles vão pagar ou não, se um dia ele poderá fazer as caixas de maneira menos tosca, o que ele sabe é que, mesmo sendo um escritor e adorar livros, literatura, fantasia, quadrinhos... Ele faz caixas. O senso de realidade se perdeu.

            Na cabeça do marceneiro, ele tinha a preocupação do que por em uma daquelas caixas que ele havia feito para outra pessoa e que ficara para ele pela caixa ter estrago no meio da confecção. A caixa possui uma tranca de cadeado, mas o que guardar tão bem lá dentro? Seus sentimentos não poderiam ser, não amava ninguém e ninguém o amava, vivia só em um mundo que ele mesmo criara. Pensamentos, então? Talvez, se ele pudesse achar que eles servissem para algum propósito ainda desconhecido por ele e que são irrelevantes agora. ‘Objetos físicos?’ pensou ele, por fim. ‘Não. Não há nada de valor nesse mundo para mim que caiba numa caixa tão pequena’, disse respondendo a si mesmo. A busca continuava...

            Foi então que ele percebeu que só restava uma última coisa a colocar naquela caixa: a esperança. A esperança de algum dia ter algo para colocar numa caixa vazia...

            Ele abriu a caixa, olhou para dentro dela, de olhar fixo no seu fundo escuro diferente do resto da caixa. Deu um último suspiro e procurou se lembrar daquilo que tinha vontade de colocar na caixa. As ideias que lhe viam eram de ter um país melhor, um país de verdade, um país em que pudesse confiar e que no meio de uma guerra, seja política ou da sobrevivência, ele pudesse lutar e se sentir merecedor do título pátrio que recebera ao nascer. Sonhava também que um dia colocasse na caixa o seu coração, preenchido por uma paixão que lhe dissesse que a vida valera à pena. Quem um houvesse de ter sentido no corpo o calor de outro corpo, uma sintonia sem igual que o fazia chorar de puro contentamento. Alguém que ele tinha certeza que nunca apareceria em sua vida. Um sonho quebrado que nunca seria concertado e que ele tinha certeza que se alguém recolhesse os cacos, seria para triturá-los de vez...

            Pensando mais um pouco, colocou lá no fundo da caixa, escondido sobre as outras esperanças, a sua inocência e bondade. Acreditar no mundo? Por mais que seu coração lhe implorasse por piedade, que eles não sabiam o que estavam fazendo, ele era fraco demais para conseguir resistir à força da sociedade que deixa de lado tudo aquilo que você fez certo na sua vida, mas que por um erro, um único erro, te massacra por ser culpado, mesmo quando errar é humano. Para fazer parte da sociedade você não pode errar, você nunca pode errar. Errar é uma facada fria nas costas que te faz subir o sangue pela boca e aos poucos destrói a sua ingenuidade que morre nos seus braços. Viver se tornar algo sério, pesado, impossível de suportar, tudo porque você errou uma única vez. Seu erro, que ele queria esconder dentro da caixa, era ter nascido...

            Colocou também dentro da caixa a sua frustração como pessoal. Ele não era a pessoas que queria ser, ele não era o filho que queria ser, ele não era o irmão que queria ser, ele não era o familiar que queria ser, ele não é o amigo que queria ser, ele não era o profissional que queria ser... Em sua mente, ele era inútil e se ele era inútil, ele era desnecessário, dinheiro que seus pais poderiam ter gasto com uma casa própria, com a faculdade dos irmãos, com a felicidade que ele nunca pode ter contribuído. Além disso, colocou por fim as suas lágrimas, o pranto que ninguém ouviu ou se importou em perceber. Ele não estava satisfeito consigo mesmo e não queria se permitir estar, só assim para se sentir justo consigo.

            Olhou para a caixa de madeira e chorou diante dela. Ele a fecharia para sempre e assim o fez. Baixou a tampa e passou o cadeado. Deixava ali uma data, até o final do ano, menos de seis meses, se algo não mudasse em sua vida ele destruiria todos os sonhos que estavam fora da caixa. Abandonaria seus textos e se entregaria à marcenaria, fazendo caixas e mais caixas. Apenas caixas.

            Com um cordão azul, ele amarrou a chave do cadeado no pescoço e decidiu que o levaria para onde fosse. A caixa estava trancada com suas esperanças dentro e ficara com a chave para se lembrar que elas estavam lá. No rosto, levaria um sorriso que não era dele; na cabeça, teria pensamentos que não eram dele e procuraria fazer coisas que ele não queria fazer. Guardou a caixa em um lugar alto e falou para si mesmo:

            – A vida é assim, um dia você cresce e não sabe porque existem sonhos...

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Devil’s Drink 19 – Preciso de ajuda


Devil’s Drink 19 – Preciso de ajuda



            En’hain não estava muito bem, seus sentimentos estavam confusos... Eram aquilo sentimentos de verdade? Essa era a pergunta que ele estava se fazendo naqueles dias tumultuados de sua cabeça. O bar precisava de alguém mais responsável, talvez? Ou seria uma das partes que constituíam o plano etéreo ou material que se digladiavam dentro dele, o dragão da terra e o dragão do céu. Sua personalidade estava sendo consumida a cada vez que ele precisava assumir o corpo metálico – com certeza a batalha travada dentro dele deixava marcas profundas e violentas em seu frágil ser.

            Ele tentava ater-se aos sentimentos que o seu coração lhe dizia, o carinho que tinha por Akai, a amizade com Gurei, Sasha e Lady Neko e a sensação estranha quando se encontrava com o Senhor Gunshin, o dono do bar. Mesmo assim, dia após dia, algum problema lhe virava a cabeça e tirava-o do sério, estressando En’hain tremendamente. Enfim, sua consciência acabou apagando. Os outros mal teriam percebido isso, não fosse a garrafa de Devil’s Drink que se espatifou no chão. O barman cambaleou, tentou se segurar nas prateleiras cheias de garrafas e foi ao chão, derrubando tudo em que se segurara. Naquela noite o bar não iria abrir...

            Lady Neko foi até o templo dos gatos chamar o vovô para que pudesse ajudar En’hain. Enquanto isso, Akai e Gurei ficavam observando o amigo e Sasha limpava a bagunça:

            –Acho que ele vai morrer... – Disse o neko russo com seu típico humor ácido e inconveniente.

            –...! – Akai olhou pra ele com desprezo. – En’hain vai ficar bem, seu babaca!

            –Tem certeza Santiago? – O gato cinza sorria com um ar de cínico.

            –Certeza absoluta, Alexander! – O pequeno neko falava com firmeza.

            –Depois dele tanto ter cuidado de nós e da vila, nós nem notamos que ele estava ficando doente... – Agora seu tom era mais amigável.

            –... – Gurei conseguiu fazer Akai ficar calado e desviar o olhar.

            Indignado consigo mesmo, o gatinho avermelhado saiu do quarto e foi se meter no meio da floresta do silêncio. Gurei assistiu aquilo com muita curiosidade:

            –O que será que o seu amiguinho foi aprontar, En’hain?

            O barman não podia responder com clareza, mas balbuciava algo:

            –Akai... Akai... Akai... – No canto dos olhos, pequenas lágrimas escorriam.

...

            Não dava para saber se En’hain ficaria bem ou se Akai voltaria para o bar. A partir de agora, o destino da Toca dos Gatos se tornou incerto...

...

            “Onde estão, onde se escondem os verdadeiros sentimentos? A noção de realidade foi completamente perdida!” – Alguém chorava no velório.