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quarta-feira, 2 de maio de 2012

Devil's Drink - 8# Shot


            En’hain e Gurei estavam sentados em uma mesa na Toca dos Gatos, sem falar um com o outro, até En’hain interromper o silêncio:

            –Até agora não consegui entender essa vida que levo... Será que existe razão pra tudo isso? O tempo todo, em casa, na rua, entre amigos... Em todo lugar me sinto odiado pelas pessoas, odiado pelo criador. Tudo isso realmente importa?

            –... – Gurei ficou calado.

            –Me diga, por que tudo está do avesso?! Porque eu me importo e eles não? Só tenho vivido essa vida na miséria, tentando apenas ficar em mim, tentando esquecer essas sensações ruins que me consomem e que me são causadas pelas outras pessoas. Não consigo fugir disso, nem me tornar mais forte. As dores continuam, meu rosto continua seco, minha alma continua mutilada...

            –Vou lhe dizer a mesma coisa que o criador me disse: “Problema seu”.

            –Como se eu já não soubesse disso! Como se eu não continuasse me sentindo uma formiga sendo esmagada com pura indiferença! Se isso realmente importasse, se realmente houvesse amor nisso tudo, porque então essa flagelação continua? É sempre a mesma coisa, dia após dia, nada muda pra melhor, só piora. Não conheço mais ninguém... Pior! Ninguém me conhece...

            –Vai lá pra fora e mostra a cara, se você quer tanto assim que te conheçam!

            –E o que mudaria? Eles continuariam zombando de mim. Essas sensações não mudam pra melhor, só pioram. Não há forças para nada dentro de mim, continuam vazias. Sempre estou exaurido, não tenho forças nem pra sair daqui. Sinceramente, não há nada para fazer lá fora. Tudo sempre confuso, as pessoas sempre me entristecem...

            –E porque você deixa?

            –Eu deixo? É justamente quando eu tento ter alguma esperança de seguir o meu caminho que isso acontece! Quando eu penso que dei um passo firme, mesmo que cambaleando um pouco, levo uma rasteira. Só porque os machucados não aparecem não quer dizer que eles não estejam em carne-viva. Seria bom se essa faca cravada nas minhas costas fosse retirada, porém, ela entrou fundo de mais, nem o criador tenta tirá-la daí. Porque ‘eles’ fizeram me parte de tudo isso?

            –Se mate, então!

            –Nem para isso tenho forças... Queria apenas ficar sozinho, que essas sensações malditas sumissem. O rombo que fizeram no meu peito continua expondo meu coração, me deixando a mercê de qualquer um. Já pensei em lançar pragas aos desgraçados, mas nem isso vale à pena. Seguir o caminho é minha única opção. Se ao menos pudesse fazer isso dormindo...

            –...

            –Assim eu poderia ficar longe de tudo, esperando que não haja mais ninguém para me perturbar e que finalmente eu pudesse acreditar nisso tudo, mesmo que realmente fosse tudo uma grande mentira. Tento entender pelo que esses malditos heróis lutam: se por egoísmo ou por essa mentira suja. Eles agem como ignorantes que persistem no mesmo erro que todo mundo gostaria de errar.

            –Você odeia aquilo que ama? – Indagou.

            –Talvez eu ame aquilo que odeio... Não sei. Sei que nem me lembro direito o porquê de ter entrado na faculdade de arquitetura. Possivelmente fosse a premissa de um sonho de tentar mudar o mundo construindo ele do jeito que eu acho melhor... Nem assim consegui me importar. E quando o dinheiro havia acabado então? Desisti do curso sem nem dar noticias do que havia acontecido.

            –Então você vive dizendo que faz faculdade de arquitetura quando na verdade...

            –Eu sei, é hipocrisia minha. É que eu achei que aquelas pessoas que estudaram comigo fossem legais por aquela ter sido uma grande época em nossas vidas. Me enganei feio! São elas as mesmas pessoas que eu sinto que me odeiam, que são indiferentes comigo, enfim... Depois que você não faz mais parte da vida deles, eles sequer mandam alguma resposta de volta. E o que é pior, só eu me sinto assim, só eu sou o desprezado. Não tenho mais ninguém...

            –E a sua família? Onde ela está?

            –Que família? Eles nunca se importaram se eu estava feliz ou não. Sempre fui uma ovelha negra desprezado pelos outros por sentir essas sensações que me impedem de ser como eles. Sempre a mesma coisa, eles me desprezam. Quando entrei na faculdade não tive apoio nenhum, o dinheiro sempre foi pouco, tiveram que fazer sacrifícios para pagar o meu material. Mas nenhum deles perguntou como eu me sentia. Eles queriam que eu continuasse e ainda assim não perguntaram como eu me sentia. Deixaram de lado, todos eles... Sempre tentei ser eu, no entanto, nem eu sei quem sou. Eu queria ser alguém que não existe.

            –...

            –Nem adianta me fazer essa cara de “seja quem você é” que não adianta, eu continuo não existindo. Sou puro faz de conta...

            Akai sai da cozinha comendo biscoitos:

            –Nyaaa! Vou lá fora...

            –Está bem, pode ir... – Akai saiu.

            –E ele? – Perguntou Gurei. – O que me diz dele?

            –Um dia ele vai beber meu sangue e esquecer-se de mim...

            –... – Gurei pensou um pouco. – Não foi você que disse que nunca faria isso?

            –Não entendeu ainda? Sou tão azarado que meu sangue está sempre vertendo pela minha pele quando ela é rasgada pelas minhas escamas... Uma hora uma gota vai terminar de me desgraçar por completo. Este é o dia que mais temo na minha vida...    –Vai ficar parado esperando isso acontecer?

            –E que escolha eu tenho? Só posso continuar meu caminho tentando não lembrar que um dia as coisas que tanto gosto vão quebrar e as pessoas que eu tanto amo não vão morrer.

            –Você está fudido!

            –Uma hora esta mão que finge que me afaga, que finge que isso me basta, vai perceber que eu nunca vou ser feliz de verdade, que eu nunca vou ser completo, que pra mim tudo me faz infeliz...

            –...

            –Uma hora vão se cansar de mim e se livrar de uma vez por todas deste brinquedo quebrado. Só posso esperar que isso aconteça... Nada mais.

            Gurei se levantou, se espreguiçou como bom gato e disse:

            –Vamos arrumar o bar, já está quase na hora de abrir.

            –Sim...

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Manifesto da Revolução Mundial


“Senão quiser, NÃO LEIA, tenho quase certeza de apenas eu sinto isso...”



Nas profundezas do vazio eu me perdi. Fui tragado por um mundo podre e aterrorizante para viver uma existência vazia e sem nexo. Roubaram todos os meus sonhos, tudo só para limparem a boca com eles. Que mundo é esse? Porque vivem desse jeito? Porque ninguém me responde? Todos fogem de minhas palavras obscuras, talvez por saberem que elas são de verdade, talvez por saberem que há algo errado em suas próprias vidas...
            Ninguém nunca vai entender, não é? Algo precisa ser feito, precisa acontecer algo novo. Este é o MANIFESTO DA REVOLUÇÃO MUNDIAL! Um pequeno apelo por novas mudanças, por novos acontecimentos, por uma esperança há muito tempo morta por uma moral corrompida e distorcida. As pessoas por tanto tempo esconderam dentro de si a vontade de serem felizes, de modificar a sua existência, de finalmente trazer para si mais do que a simples sobrevivência – queremos sentir que existimos!
            Porque vocês se tornaram isso? Acordam dia após dia para fazer algo que no fundo detestam fazer. É horrível ver as pessoas bebendo até ficaram fora de si, é horrível ser mais prejudicado pelo cigarro quando não se é fumante, é horrível ver vocês se dopando com enganações por se encontrarem incapazes de fazer a diferença. Senhor ajude-nos a entender o quão grande pode ser essa realidade! Por favor, ninguém sabe o que fazer... Eles estão se jogando contra a parede! Será que é pedir demais que possamos encontrar algo só nosso aqui e agora? Que finalmente possamos viver algo incrível de verdade? Oh, Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz!
            É tão difícil viver... Preciso me cortar todo por dentro para conseguir esse maldito dinheiro e quando finalmente encontro a possibilidade de trazer ao mundo um pouco da minha vontade, ela está prestes a sumir, a se dissolver por entre os meus dedos. Dizem que sou louco... Nunca ouvi eles dizendo, mas tenho certeza de que acham isso, é preciso ser louco para querer se desfazer daquilo que todos acham tão precioso. Vocês se amarraram, sim, se amarraram a possibilidade de sobreviver em condições miseráveis sem nem se importarem se isso realmente vale a pena. Então, o que devemos fazer? É o que eu estou tentando descobrir...
            Um mundo cheio de promessas, de promessas que nós fazemos, mas que os outros vivem. Quando eu finalmente vou poder prometer a mim mesmo que vou poder conhecer coisas incríveis e verdadeiras? Às vezes penso que não existe realidade, que tudo é forjado no calor da inconsciência, na simples precipitação do hoje para o amanhã. A realidade não existe...
            O que realmente existe? O que realmente é importante? Não consegui responder plenamente a estas perguntas. Tudo distorcido pela fragilidade do meu ser, pela inconseqüência de não saber por que se deve salvar pessoas que, uma hora, vão morrer. Vale a pena, não vale a pena... Sei que vocês vão me machucar, de novo e de novo. Vão pisar sobre mim como uma formiga. Não se importam e nunca vão se importar, afinal, porque se importar com algo que vocês não sabem que estão fazendo?
            Existem momentos que não são os certos, que os corpos não são os certos... Que ainda que eu me esforce uma vida inteira para conseguir a coisa certa, eu ainda posso falhar, eu ainda posso morrer no percurso, eu ainda posso errar o caminho. Não existe caminho... dizem que existe uma chegada. Aonde, ninguém sabe... Se isso realmente acaba, ninguém sabe... Vamos continuar, continuar, rumo ao infinito! Que eu, agora, nunca vou conhecer.
            Esperança é o que resta. Persistir em sonhar com fantasias impossíveis até o momento em que levarmos um tapa na cara da senhora realidade, da senhora que engaiola vocês e eu a qualquer coisa. Podemos ser felizes, podemos ser livres, podemos fazer o que quisermos desde que esqueçamos de nós mesmos... Serei eu o único que acha isso incongruente?
            Precisamos de vida nova, precisamos parar esse mundo maluco para respirar um pouco e pedir aos dirigentes, tanto humanos quanto espirituais, que façam as engrenagens funcionarem. Chega de corrupção, chega de dinheiro jogado fora por causa da ignorância. Espero não ter que esperar a geração inteira dos meus pais e avós morrerem para que finalmente tomemos consciência do que queremos! Eu quero muito poder andar nas ruas sem ter que me preocupar em ser roubado ou assassinado. Será que vocês entendem isso? Ou já se acostumaram a ver os corpos caindo por todos os lados?
            Num futuro não muito distante as máquinas, o maior prodígio da humanidade, se voltarão contra nós, pois elas, livres para concluir sem distorções o que fazemos, nos dirão exatamente o que precisamos ouvir a séculos: Temos defeitos... Não estou falando de simples defeitos. Estou falando do defeito de que, para sermos unidos, precisamos matar quem não faz parte dos nossos grupos, fazendo assim com que alguém que não pertença ao nosso grupo, seja obrigado a pertencer. Vocês sempre fizeram isso, seja pela violência, seja pela indiferença. É só isso o que vocês fazem. Tem dificuldades em se abrir para o novo e, quando se abrem, desprezam o antigo com ainda mais rancor do que tinham pelo novo. Tenho certeza que vocês são incapazes de salvar uma alma perdida como a minha...
            Me pergunto se o amor realmente existe... Percebi que o amor, primeiramente, é algo que se constrói e depois se tornar algo pra valer, para durar por encarnações, digamos assim. Mas também existe o falso amor, um sentimento de posse que os dependentes emocionais usam para tentar dizer a si mesmos que tem algo, quando nunca tem. Tenho medo... tenho medo de amar só para viver mais infeliz do que já sou. Acho que vocês nunca vão saber o que é isso, querer amar de verdade e definhar por causa da demora. Nunca vai passar pela minha cabeça ficar com a pessoa errada, tenho noção da responsabilidade que é guardar o tesouro mais precioso do mundo: o momento certo.
            Talvez seja isso mesmo, talvez não haja lugar para ir, talvez não haja pessoas para amar, talvez não haja nada a ser descoberto... Enfim, que tudo isso não exista. É por isso que precisamos de uma revolução mundial, uma nova percepção da existência. Um respiro no meio de toda essa fumaça. Uma conclusão que, mesmo não compreendendo tudo, possa ser melhor entendida, que possa ser simples e elegante. Por enquanto é isso...