segunda-feira, 7 de maio de 2012

Bem Vindo à Toca dos Gatos


            Neste Bar você encontrará histórias para se divertir e pensar, histórias de ação e de aventura, um mundo inteiramente fantástico só pra você! Tudo no dia a dia dos personagens que trabalham neste bar tão inusitado, no limiar da realidade e da fantasia.

            Nosso personagem principal se chama En’hain (en-rra-in), um draconiano que teve seus poderes despertados por Gunshin, o misterioso dono do Bar Toca dos Gatos, que também é um draconiano. En’hain era um estudante de Arquitetura que teve de enfrentar a maior desgraça de sua vida: a miséria. Triste com sua própria existência sem sentido se perdeu no meio de uma tempestade de neve em pleno inverno e adentrou uma floresta densa e escura de árvores altas e silenciosas. Realmente, nenhum barulho se faz nessa floresta. Perdido nos seus pensamentos, En’hain continuou andando até encontrar algumas luzes estranhas, pensou ter voltado para a civilização. Mas estava enganado, o que ele havia encontrado era muito mais que isso...

            A Vila dos Gatos é o último lugar na Terra em que o impossível se torna real, onde as antigas fantasias dos loucos se fazem presentes. Pois é nessa vila que fica o Bar Toca dos Gatos, lugar onde diversas criaturas do mundo transversal encontram um momento de descanso merecido.

            Os moradores dessa vila são os nekonins, gatos-humanóides que possuem origem misteriosa e que para fugir dos maus-tratos que lhe são impostos se refugiam sobre a proteção da parede de silêncio, barreira mística que protege a Vila dos Gatos do mundo exterior, levando embora as memórias perversas de quem entra e todas as memórias de quando se esteve lá dentro. Existem outros atributos desconhecidos dessa magia antiga que só serão descobertos mais tarde. A principal característica dos nekonins é que todos são incrivelmente bonitos e estilosos, sempre aparentando serem jovens, quando, na verdade, tem dezenas de anos.

            Dentre os nossos nekos, forma mais conhecida desses seres que parecem humanos de orelhas peludas, cauda comprida e garras afiadas; temos o jovem Akai, o pessimista Gurei, a bela e poderosa Lady Neko e o vovô tarado Nekomata.

            Akai (foto) aparenta ser um jovem adolescente que não possui muita cognição ao falar, repetindo diversas vezes a palavra: Nyaaa (nhaaa). Seu pelo é avermelhado, por isso seu nome, que quer disser vermelho, avermelhado. Gosta muito de comer, tomar café da manhã bem cedo, é inocente e gentil. Está sempre na cola de En’hain que, por ter aberto sua caixinha – lugar de onde os nekos aparecem – tornou-se seu mestre. Akai não fará nada sem que seu mestre permita fazer, fazendo beicinho quando algo lhe é negado. Muitas vezes ele fica agitado, principalmente quando está com fome, mexendo no que não deve e arranjando muita confusão.

            Gurei é o mais chato da casa. Fala a primeira coisa que lhe vem à cabeça, sem se importar se alguém se magoou com isso. Ele sempre pensa na pior das possibilidades, sendo superado apenas pelo depressivo En’hain, que diz ter perdido completamente a esperança em tudo. Perto dele, Gurei nem parece tão chato assim, apesar de estar sempre implicando com Akai, que acha infantil demais, e com Lady Neko, que possui um corpo avantajado e muito provocante. Gurei usa um tapa-olho no lado direito do rosto, que ele diz ter sido arrancado pela crueldade humana, que é o que mais odeia nesse mundo. Ele só confiou um pouco em En’hain, por este não ser mais humano, só por isso...

            Lady Neko, por sua vez, é um verdadeiro mulherão, loira de cabelos longo, de busto farto, extremamente feminina e gentil, apesar de ter uma força que botou o Senhor Gunshin no chão – o que assusta En’hain e Gunshin. Não se sabe muito sobre ela, sabe-se que ela mora na vila há muito tempo, que morava anteriormente no templo dos gatos e carrega uma aliança numa corrente no pescoço. Ela parece se fazer de boba, mas de boba não tem nada...

            O último gato que aparece frequentemente no Bar é o vovô Nekomata que, acreditem, ele tem mais de mil anos de idade! Ele é o mais velho e mais sábio gato que vive na vila, já tendo adquirido a segunda calda e poderes etéreos capazes de controlar os mortos – ele que sempre vive dizendo isso. No entanto, o único poder que ele demonstra ter é o de transformação que diz ter adquirido no Japão com uma velha chaleira. Ele vive no templo xintoísta dos gatos, a construção mais alta que se tem na vila. Nekomata diz ter construído sozinho aquele templo para receber os novos nekos com a paz celestial que a harmonia com a natureza pode trazer. Outros dizem que ele pediu dinheiro emprestado que nunca pagou, contratou funcionários que nunca pagou e que ele teria construído o templo somente para observar as gatas da vila. Vai saber! Ele é apenas um gatinho tarado que finge ser um gatinho mais novo para ficar perto das gatas da vila... É o que disseram!

            En’hain e companhia encontram muita confusão na vila, por parte por causa deles mesmos, outra parte por seres amorfos que vêm do abismo, outra por causa dos elementais dos reinos subterrâneos que não gostam nem um pouco de serem incomodados e outra ainda por causa dos caçadores, humanos que insistem em invadir a Vila dos Gatos para roubar o que for... Mas En’hain sempre estará lá para protegê-los! Já que Gunshin sempre tem desaparecido...

            Venha você também conhecer o Bar Toca dos Gatos, onde se prepara os Drink Shots, drinques alucinógenos que vão fazer você conhecer as incríveis histórias desses personagens um pouco... Bem, o drinque mais comum é o Devil’s Drink, a bebida mais pedida da casa. Além dele existe uma outra bebida, secreta e de efeito mais forte, mas que En’hain ainda não consegue fazer com perfeição: a Angel’s Drink. Dizem que o último que a bebeu desapareceu depois de ter tomado... O que será que colocam nessas bebidas? Para saber, continue com a gente, ficaremos honrados em atendê-lo! Apesar do Akai ser desastrado e de Gurei demorar com o pedido... Aquele gato miserável! Ahn? Ainda está escrevendo? Edita isso, edita isso...

sábado, 5 de maio de 2012

Devil's Drink - 11# Shot

            O Bar Toca dos Gatos abre praticamente o ano inteiro, exceto por um único dia: O dia das Bruxas. Segunda a antiga tradição celta, o ano começaria no dia primeiro de novembro, sendo este um dia sagrado – o dia de todos os santos. Eventualmente, o dia anterior é considerado um dia escuro, onde seres do plano transversal sobem a superfície. A vila dos Gatos é protegida por uma magia antiga chamada parede de silêncio que não deixa o plano transversal passar para o plano físico. Porém, nesse dia, as criaturas do abismo, os amorfos, conseguem ultrapassar essa barreira e ficam perambulando pelas ruas da vila. Aquele que for pego por uma dessas criaturas nunca mais volta a ver a luz...
...

            –Akai, saia já dessa janela! – Disse En’hain já sem paciência.
            –Nyaaa! Eu quero ver... – O gatinho fazia beicinho.
            –...! – En’hain fechou a cara.
            –Tá bom... – O gatinho estava se retirando.
            De repente, ouviu-se um barulho do lado de fora. De súbito, Akai voltou para a janela esperando ver alguma coisa:
            –BUU! – Um ser disforme apareceu na janela.
            –NYAAA!!! – O gatinho se assustou e se escondeu debaixo de uma mesa.
            –Gurei, vá à merda, seu desgraçado! Tem nada melhor para fazer não? Assustar o pobre do Akai desse jeito... – Gurei sai debaixo de um lençol completamente preto. – Entre já, essas criaturas vão aparecer a qualquer momento.
            –Hahaha, você devia ter visto a cara dele. – Gurei entrou no bar. – Foi hilário... hihihi.
            –Ha-ha... Muito engraçado... Estou rindo muito com isso... Canalha!
            En’hain foi para trás do balcão, onde limpava os copos, pensativo. Akai olhou para Gurei e correu para trás do balcão ainda nas quatro patas:
            –Nyaaa! Lady Neko? – Perguntou Akai.
            –Sim... Ela foi ficar com o vovô gato, o Nekomata... Espero que ela fique bem...
            –Que preocupação é essa? A vaca leiteira sabe se cuidar muito bem...
            –...! – En’hain olhou para Gurei com um olhar assassino... – Não é isso...
            –O que é então? Não vai me dizer que...
            –Qual é o seu problema, hein?
            –Você é mesmo muito engraçado, haha... Você está tendo sensações esquisitas de novo! – Gurei não se aguentava de rir.
            –Vá-te catar Gurei... – En’hain joga o copo que enxugava na cabeça de Gurei.
            –Ai, cacete! Doeu... – Gurei esfregava o galo na cabeça. – Não tinha nada mais duro não?
            En’hain olhou novamente com seu olhar assassino e começou a apontar uma garrafa das grandes:
            –Tá bom, tá bom... Não tá mais aqui quem falou... Sossega dragão! – En’hain apertou forte o punho enquanto uma veia na sua testa saltava. – Vixi!
            Akai ficava meio escondido atrás do balcão, apenas com seus olhinhos e com suas orelhinhas aparecendo. En’hain fez um cafuné nele e voltou a enxugar os copos do balcão. Então alguém começou a bater freneticamente na porta:
            –Quem será? – Disse En’hain se dirigindo à porta.
            –En’hain, meu querido, preciso de ajuda! – Disse Lady Neko afoita.
            –Espere aí, o que foi que acontece? Porque você está assim.
            –Tinha um pequeno neko lá no templo do vovô gato... Eu não encontrei ele e o neko tava desmaiado... eu vim correndo sem saber o que fazer...
            –Quê? Não dá para entender nada dona peituda...
            –O QUE VOCÊ DISSE?! – Lady Neko acertou aquela garrafa grande que En’hain pensava e jogar.
            –Gurei tem razão, não deu pra entender nada. Pode repetir, com mais calma dessa vez?
            –Ei, ninguém vai me ajudar não? Acabei de ser bombardeado!
            –Bem, eu cheguei ao templo e não encontrei o Senhor Nekomata. – Lady Neko se sentou num dos bancos do balcão para se acalmar. – Não tinha ninguém lá, exceto um pequeno neko muito bonitinho, eu me aproximei um pouco e ele desmaiou. Vim pra cá correndo.
            –Certo, vamos até lá ver direito o que aconteceu. Akai, você vem com a gente...
            –Nyaaa! – O gatinho ficou feliz.
            –Não é segurou pra ninguém ficar sozinho... – En’hain olhou para Gurei. – Você não vem?
            –...! – Gurei saiu andando como uma múmia, lento e todo enfaixado. – Eu tô bem, me deixa, eu tô bem...
            Durante todo o trajeto até o templo eles ficavam juntos, tomando cuidado para não esbarrar com nenhum amorfo. Eles estavam muito juntos:
            –Desencosta, cacete! Assim vocês me sufocam! – En’hain empurra os outros três para respirar melhor.
            –Nyaaa?! – Fez Akai.
            –Você pode subir nas minhas costas... – Os outros dois olharam para aquela cena. – Nem pensem nisso vocês dois! Onde já se viu...
            Continuando a caminhada, os quatro chegaram ao templo xintoísta dos nekos, um lugar típico dessa cultura, exceto pelos grandes gatos de pedra ladeando o portal vermelho. Cada gato levantava uma das patinhas ao lado do rosto, como quando estão tomando seu banho de língua – os do lado direito estavam levantando a pata esquerda e os do lado esquerdo a pata direita. As grandes árvores ornamentais traziam pureza ao lugar, tornando aquele dia sombrio mais bonito. Dentro do templo, encontraram o tal neko, no mesmo lugar que Lady Neko o havia deixado:
            –Vejam, ele está ali. – Lady Neko apontou para o jovem neko.
            En’hain correu para perto dele, depois de descer Akai de suas costas. Tomou seu pulso, viu sua respiração, tinha um pouco de sangue no nariz... Concluiu que ele apenas tinha desmaiado e que estava bem:
            –Lady Neko, o que exatamente aconteceu aqui? – Perguntou En’hain.
            –Como assim, eu estava aqui, ele desmaiou...
            –Você abraçou ele? – Indagou En’hain.
            –Ahn? Acho que sim... Isso é ruim? – Lady Neko era muito inocente.
            –Já sei o que aconteceu... Acorda vovô, eu sei que é você!
            –Ta-dá! – Uma pequena explosão de fumaça e o jovem neko se revelou o velho Nekomata da vila. – Gostaram da transformação? Aprendi com uma velha chaleira lá no Japão...
            –Só você mesmo, velho tapado, pra fazer uma brincadeira dessas em pleno dia das bruxas. – Disse Gurei.
            –Você devia se envergonhar por fazer uma confusão dessas! Você devia se envergonhar!
            –Eu estava tão preocupada, vovô... – Lady Neko sentiu algo estranho lhe tocando. – Mas agora que eu sei que o senhor está bem!
            Lady Neko deu um murro e tanto na cara do velhinho tarado:
            –Eles são lindos, eles são tão lindos... – Dizia o Nekomata, abrindo e fechando as mãozinhas no meio do ar, com a cabeça afundada no chão, revirando os olhos.
            Já que todos estavam ali, lá ficaram. Naquele dia, não apareceu nenhum amorfo...
            –Ahn? – Disse um amorfo no meio da rua.
            Foi isso...

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Devil's Drink - 10# Shot

            Nem todos os clientes que chegam a Toca dos Gatos conseguem ficar quietos curtindo em paz, tomando suas bebidas. Alguns teimam em arranjar brigas por puro egocentrismo. Uma vez, numa noite fria de neve de inverno, dois guerreiros de lugares distintos foram ao bar para ter alguma diversão e descobriram-se insuportáveis. Um se chamava Auran, um artífice – guerreiro que preza pela beleza e perfeição de suas missões mais do que pela batalha; o outro se chamava Hidari, um típico guerreiro que conquista tudo através das batalhas, no cara a cara, no mano a mano – nem preciso dizer o quanto ele é esquentado. Auran tem por arma uma harpa, tirando desde melodias incríveis a terríveis réquiens. Hidari usa a grande espada, uma arma maior que seu próprio corpo e tão grande quanto ele, diga-se de passagem. Eles são opostos que definitivamente não se atraem...

...

            Hidari chegou fazendo um escândalo:
            –GARÇOM!!! Eu quero sua melhor bebida!!! Minha goela está mais seca que o deserto do Saara!!! – Ele se sentou num dos bancos junto ao balcão.
            “Sujeitinho deplorável”, pensava Auran já sentado justamente no banco ao lado. En’hain fez como sempre, preparou a melhor bebida do bar, a Devil’s Drink – uma bebida alucinógena que faz quem o bebe vislumbrar um sonho. Hidari ia começar a beber, não fosse ele ter notado a grande beleza e satisfação da casa, Lady Neko:
            –Chega mais gatinha, o papai aqui quer te fazer muito feliz essa noite!
            –Miau! – Lady Neko se assustou com o puxão que Hidari lhe fez, deixando cair o pedido de um dos clientes que não ficou nada satisfeito com a atitude daquele homem:
            –Solta a moça. – Disse Auran. – Não está vendo que ela não quer nada com você?
            –E quem é você sujeitinho metido? Mamãe não lhe avisou que só deveria sair de casa depois que saísse das fraudas? – Hidari se referia à aparência franzina de Auran, deixando Lady Neko de lado.
            –... – Hidari não falou, na esperança de que o imbecil que estava a sua frente percebesse o erro que cometera.
            –É melhor ficar calado mesmo, frangote... – Hidari ia levar o copo da Devil’s Drink à boca, não fosse ele ter quebrado na sua mão. – Que porra é essa?!
            –Lá fora, agora... – Auran saiu de dentro do bar e foi para a praça da vila e Hidari foi atrás, ambos calados.
            Os dois ficaram se encarando por algum momento, esperando ver quem começava. Como o assunto não ia pra frente, Auran falou:
            –Pro seu próprio bem, acho melhor você pedir desculpas... – Hidari começou a rir descontroladamente.
            –Hahaha... Nem a pau! – Sua cara ficou séria de repente e partiu para cima de Auran, sacando sua espada.
            –Acho que vou precisar ser mais duro com você criança. – Auran saltou, desvencilhando-se facilmente do golpe, o que deixou Hidari vermelho de raiva.
            Com precisão e rapidez, Auran abriu o estojo de sua harpa oriental de treze cordas, sentou-se e começou a tocar sua música mais conhecida, a sinfonia das facas. Hidari começou a ser golpeado constantemente pelo próprio ar, que lhe fez alguns cortes superficiais. Ele colocou a grande espada na frente do corpo e a enterrou no chão, impedindo os golpes de fazerem mais estragos. Auran cerrou os olhos:
            –Você realmente pensa que algo assim vai me impedir? – Ele mudou a maneira como tocava a harpa e as facas de ar começaram a dar a volta por trás dele.
            –Desgraçado! – Depois de alguns corte, Hidari tirou a espada do lugar e deu um forte giro de trezentos e sessenta graus, mandando uma forte onda de ar que quase atingiu Auran que saltou bem alto dali mesmo. – Haha! Esse jogo é para dois, seu metido!
            –Me parece que o imbecil está se divertindo com nossa pequena disputa? – Hidari se enraiveceu mais ainda. – Ter prazer numa luta de honra é para os ridículos!
            –Miserável! – Mandou outra onde de choque para cima de Auran. – E o que você entenderia miserável! Um guerreiro de verdade vive pela sua batalha!
            –Tolo! – Auran pulou novamente para longe. – Só os tolos têm prazer em tirar a vida do próximo!
            –Ora.. seu!
            De um lado, Hidari mandava ondas de ar comprido sucessivas tentando acertar Auran; do outro Auran aumentava a intensidade de sua sinfonia de maneira frenética, sem, no entanto, estar parado. A disputa se prolongava por apenas alguns minutos, mas o estrago que causava a pequena vila dos gatos era grande. Os nekos estavam preocupados, o Senhor Gunshin estava fora de novo e se aquilo se prolongasse ainda mais, a vila poderia sofrer grandes consequências.
            –E o que você pensa em fazer? – Perguntou Gurei a En’hain.
            –Eu vou dar um jeito...
            En’hain foi mais próximo que pode daquela guerra insana e tentou falar com os dois:
            –PAREM JÁ COM ISSO! – Os dois olharam para En’hain, se entre olharam e fizeram sinais comuns, se entendendo entre eles.
            –Vamos acabar com esse aí primeiro...
            –Quem matá-lo ganha...
            –FUDEU!!! – A batalha tinha mudado completamente de sentido. – Bem, se assim que vocês querem...
            En’hain deu uma espalmada poderosa, reverberando por todo lado, chegando até os encrenqueiros que se desequilibraram um pouco, mas só um pouco:
            –Vejam só! Ele também sabe brigar. – Disse Hidari num tom de gozação.
            –Então quer dizer que Gunshin deixou este lugar sagrado nas mãos de seu barman?
            –...! – En’hain não entendia nada. – Do que vocês estão falando?
            –Acho que aqui vou poder usar meus poderes especiais... – Disse Hidari.
            –Hum, ótima idéia! Também vou usar minhas melhores notas para desfiar a carne desse intrometido.
            –Não será preciso... – Interrompeu Hidari.
            Na espada de Hidari existem duas grandes jóias, um rubi e uma safira, que possuem propriedades elementais do fogo e da água, respectivamente. Hidari colocou a espada na frente do corpo e apertou fortemente a empunhadura, liberando a energia contida nas jóias. Seu corpo se metamorfoseou sendo tomado pelas energias das salamandras e das ondinas, deixando um lado do corpo alaranjado e em chamas, e o outro azul e cristalizado. O poder Elemental também tomou conta da espada que liberou uma descarga intensa de energia sobre En’hain, que foi acertado em cheio, sumindo no meio do vapor em chamas:
            –Eu disse que não seria preciso. Onde nós estávamos, mesmo? Disse Hidari.
            –A luta ainda não terminou... Olhe! – Auran apontava para o meio da fumaça que se dispersava.
            –ISSO DOEU! – Aquele tom voz macabro anunciava que En’hain estava praticamente transformado, uma vez que sua carne fora inteiramente removida.
Porém, havia algo de diferente daquela vez, a transformação ocorrera rápido demais e não houve tempo para ele conter suas emoções. O próximo estágio de En’hain estava surgindo. Na sombra daquela fumaça podia se ver algo medonho, de olhos vermelhos e sem nenhuma outra feição, de corpo completamente prateado. En’hain sentiu dores fortes e começou a se contorcer e diversas bocas cheias de dentes surgiram pelo seu corpo. De dentro delas estavam sendo emanadas chamas azuis que tomaram conta da aura de En’hain, deixando a visão ainda mais sombria. En’hain se moveu para frente e sumiu. Os dois guerreiros nem tiveram tempo de se defender...
Pela manhã, como de costume, Gunshin, o dono do bar, aparece sem ser anunciado:
–En’hain, o que aconteceu aqui? Porque estes dois estão completamente enfaixados?!
–O idiota exagerou ontem na hora de proteger a vila... – Disse Gurei.
–...!
Foi isso...

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Devil's Drink - 9# Shot

            O coração batia forte, a adrenalina corria pelas veias. As espadas de En’hain e de Gunshin faiscavam no ar. O treinamento era árduo e cansativo, mas era preciso. O domínio dos poderes de En’hain estava longe de ser perfeito. Se ele quisesse enfrentar os reis do mundo subterrâneo e conquistar as jóias elementais para se tornar o novo guardião do plano transversal, ele teria que treinar muito. Gurei veio interromper os dois:
            –Ei, vocês dois! Já esta na hora do almoço! Lady Neko mandou chamar vocês... – Gurei sentiu um vento forte. – ...para irem tomar banho! Sério, esses dois deveriam ter menos medo dessa mulher peituda!
            Não era por menos, Lady Neko, a gata do grupo, tinha temperamento forte, além de ser folgado com todos os homens – exceto Gurei, que acha ela ridícula e peituda demais:
            –Tenho certeza, aquilo é silicone! – Disse para si enquanto voltava para o bar.
            Lady Neko é muito pretensiosa, chegou ao bar querendo por querer ser a cantora estrela do Bar Toca dos Gatos...
...

            –Mas, é o maior sonho da minha vida. – Dizia Lady Neko apertando En’hain num forte abraço.
            –(En’hain não conseguia falar direito por causa do abraço).
            –O que disse amore? Não entendi! – Ela o tirou do meio do abraço.
            –(En’hain tomava fôlego) Eu disse que isso não é comigo, é com o dono do bar...
            –Miau! E quando eu falo com ele? – Disse animada.
            –Não tenho a menor ideia... Ele sempre desaparece antes do bar abrir.
            –Nyaaa! – Lady Neko estava decepcionada. – Como eu faço então moço?
            En’hain não sabia o que fazer, seu bom coração dizia para ajudar a moça de grande... entusiasmo:
            –Você pode se apresentar hoje à noite, se quiser...
            –Ai, obrigada! OBRIGADA moço. – Novamente En’hain estava preso no abraço forte daquele mulherão.
            –Eu preciso de ajuda...
            –Como?
            –Você poderia me ajudar a arrumar o bar para hoje à noite?
            –Mas eu sou ‘A’ estrela, eu não posso ficar fazendo trabalhos pesados, moço.
            –Lady Neko... Meu nome é En’hain... O bar está sempre cheio a noite. Akai ainda é muito atrapalhado e Gurei parece que demora de propósito para entregar os pedidos dos clientes. Preciso de alguém que me ajude... Seria uma troca de favores, entende?
            –Esse é o único jeito, moço? – Disse se abraçando e mexendo de um lado pro outro.
            –Pelo menos por essa noite, eu acho...
            –Está bem... – Ela se levantou e começou a ir para a porta.
            –Aonde você pensa que vai?!
            –Miau?! – Lady Neko se fazia de desentendida.
            –Dai-me paciência... – En’hain bateu na testa. – O bar abre daqui a pouco!
            –Mas ainda nem me troquei... Não posso ser vista desse jeito e...
            –Chega... – En’hain fechou a cara. – Você quer a oportunidade ou não?
            –Está bem... Por onde eu começo? – Lady Neko abaixou as orelhas
            –Com o esfregão, por exemplo... Quando o bar abrir, vou precisar que você traga os petiscos que estiverem na cozinha e os traga para o balcão. Juro que não vai ser difícil.
            –Miau... – Lady Neko fazia beicinho e estava com os olhos brilhando, quase chorando.
            En’hain fechou a cara e fumaça estava saindo de sua cabeça. Saiu andando e entrou na cozinha.
            Quando o bar abriu, várias criaturas do mundo transversal estavam lá para curtir um pouco, longe do trabalho repetitivo que os Devas lhe mandam fazer durante o dia. O bar era animado e muita música divertida tocava nas caixas de som. En’hain, Akai e Gurei estavam vestidos a caráter, com seus uniformes, e Lady Neko vestia uma roupa de garçonete lolita, com muito babado:
            –Onde foi que você achou essa... gata! – Perguntavam os clientes. – É, nos apresente ela, cara. Faz esse favorzinho.
            “Onde foi que essa mulher encontrou esse vestido?”, se perguntava En’hain atrás do balcão, “Isso não está me cheirando bem”.
            –En’hain, que cheiro é esse? – Perguntou Gurei.
            –Ahn?
            –Que cheiro é esse?! Parece estar vindo da cozinha!
            –FUDEU...
            En’hain correu para a cozinha e encontrou Lady Neko desesperada tentando apagar o fogo da comida que estava tentando esquentar:
            –Mas será o Benedito?! – En’hain tentou ajudar a moça.
            –Era encrenca, desde o começo era encrenca. Eu disse pra você nem deixar essa peituda entrar, mas não! Você tinha que conversar com ela, não é?
            –Cala a boca Gurei!
            –...!
            –Me desculpem, é que um cliente pediu pra dar uma esquentadinha na comida e não sei bem o que aconteceu, tentei ligar no fogo baixo...
            –Ufa! Apagou... Da próxima vez, tente usar o microondas!
            –Miau! – Lady Neko fazia beicinho e choramingava.
            –...! – Fizeram os dois fechando a cara.
            –Sua apresentação é daqui a pouco. – Disse En’hain. – Vá se arrumar.
            –Miau! – Fez ela contente.
            Depois que tudo estava arrumado, os ânimos dos clientes estavam acalmados, En’hain subiu ao palco e anunciou Lady Neko, que descia as escadas num vestido vermelho com um decote que ressaltava ainda mais os seus... atributos. Gurei controlava a luz do palco e diminuiu a luz do bar, colocando um holofote sobre a descida de Lady Neko, fazendo seu vestido brilhar, assim como seu cabelo loiro. Isso a fez sorrir, estava sentindo seu sonho se realizar. Subiu ao palco como uma verdadeira corista e sua doce voz se fez, encantando os cliente do bar. Ela não cantava música alguma, apenas fazia sons agradáveis e melodiosos e de vez em quando soltava um miado musical:
            –Sabia que tinha me esquecido de alguma coisa! – Concluiu En’hain.
            –Você é um tapado, sabia? – Completou Gurei.
            –Nyaaa! – Fazia Akai curtindo a música.
            Quando o bar fechou na madrugada, faltava pouco tempo para o sol amanhecer. Toda sujeira já estava nos sacos de lixo e precisavam que alguém os levasse para fora:
            –Gurei, leve-os sacos lá fora. – Mandou En’hain.
            –Tudo bem... – Quando En’hain virou as costas e foi para a cozinha, Gurei olhou para a novata. – En’hain mandou você levar o lixo para fora.
            –Nossa! Ainda tem mais?!
            –Vá logo, é só colocar na lixeira que fica ao lado do bar.
            –Esta bem... miau. – Ela abaixou as orelhas. – Não importa o frio que está lá fora, nessa grande escuridão medonha...
            –Pare de fazer a dramática e vai logo, sim... – Gurei emburrava Lady Neko para ela sair de uma vez.
            Não deu muito tempo, ouviu se gritos e pancadaria do lado de fora. Até En’hain ouviu e saiu para ver o que estava acontecendo:
            –O que foi Lady Neko?! O que está acontecendo?! – Perguntou levando uma lanterna e iluminando a mulher gato no meio do escuro.
            –Este tarado tentou mexer comigo! – Todos se espantaram, Lady Neko estava em cima do meliante.
            –Já pode sair de cima dele... – Disse Gurei, enquanto En’hain a ajudava a se levantar.
            –Vamos ver quem é ele... FUDEU!!! – En’hain viu que o tal meliante era na verdade o senhor Gunshin. – Esse é o dono do bar!!!
            –Miau?! Será que eu matei ele?! – Disse a moça.
            –Corre cambada! – Gritou Gurei que saiu correndo. Os outros dois também foram para dentro do bar.
            O dono do bar se levantou, meio tonto com o que aconteceu:
            –Nossa, desde quando temos trem na vila dos gatos?! Aliás, o que aconteceu com a moça? Eu ia perguntar pra ela o que ela estava fazendo na rua uma hora dessas... É melhor eu entrar, ainda estou muito tonto...

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Devil's Drink - 8# Shot


            En’hain e Gurei estavam sentados em uma mesa na Toca dos Gatos, sem falar um com o outro, até En’hain interromper o silêncio:

            –Até agora não consegui entender essa vida que levo... Será que existe razão pra tudo isso? O tempo todo, em casa, na rua, entre amigos... Em todo lugar me sinto odiado pelas pessoas, odiado pelo criador. Tudo isso realmente importa?

            –... – Gurei ficou calado.

            –Me diga, por que tudo está do avesso?! Porque eu me importo e eles não? Só tenho vivido essa vida na miséria, tentando apenas ficar em mim, tentando esquecer essas sensações ruins que me consomem e que me são causadas pelas outras pessoas. Não consigo fugir disso, nem me tornar mais forte. As dores continuam, meu rosto continua seco, minha alma continua mutilada...

            –Vou lhe dizer a mesma coisa que o criador me disse: “Problema seu”.

            –Como se eu já não soubesse disso! Como se eu não continuasse me sentindo uma formiga sendo esmagada com pura indiferença! Se isso realmente importasse, se realmente houvesse amor nisso tudo, porque então essa flagelação continua? É sempre a mesma coisa, dia após dia, nada muda pra melhor, só piora. Não conheço mais ninguém... Pior! Ninguém me conhece...

            –Vai lá pra fora e mostra a cara, se você quer tanto assim que te conheçam!

            –E o que mudaria? Eles continuariam zombando de mim. Essas sensações não mudam pra melhor, só pioram. Não há forças para nada dentro de mim, continuam vazias. Sempre estou exaurido, não tenho forças nem pra sair daqui. Sinceramente, não há nada para fazer lá fora. Tudo sempre confuso, as pessoas sempre me entristecem...

            –E porque você deixa?

            –Eu deixo? É justamente quando eu tento ter alguma esperança de seguir o meu caminho que isso acontece! Quando eu penso que dei um passo firme, mesmo que cambaleando um pouco, levo uma rasteira. Só porque os machucados não aparecem não quer dizer que eles não estejam em carne-viva. Seria bom se essa faca cravada nas minhas costas fosse retirada, porém, ela entrou fundo de mais, nem o criador tenta tirá-la daí. Porque ‘eles’ fizeram me parte de tudo isso?

            –Se mate, então!

            –Nem para isso tenho forças... Queria apenas ficar sozinho, que essas sensações malditas sumissem. O rombo que fizeram no meu peito continua expondo meu coração, me deixando a mercê de qualquer um. Já pensei em lançar pragas aos desgraçados, mas nem isso vale à pena. Seguir o caminho é minha única opção. Se ao menos pudesse fazer isso dormindo...

            –...

            –Assim eu poderia ficar longe de tudo, esperando que não haja mais ninguém para me perturbar e que finalmente eu pudesse acreditar nisso tudo, mesmo que realmente fosse tudo uma grande mentira. Tento entender pelo que esses malditos heróis lutam: se por egoísmo ou por essa mentira suja. Eles agem como ignorantes que persistem no mesmo erro que todo mundo gostaria de errar.

            –Você odeia aquilo que ama? – Indagou.

            –Talvez eu ame aquilo que odeio... Não sei. Sei que nem me lembro direito o porquê de ter entrado na faculdade de arquitetura. Possivelmente fosse a premissa de um sonho de tentar mudar o mundo construindo ele do jeito que eu acho melhor... Nem assim consegui me importar. E quando o dinheiro havia acabado então? Desisti do curso sem nem dar noticias do que havia acontecido.

            –Então você vive dizendo que faz faculdade de arquitetura quando na verdade...

            –Eu sei, é hipocrisia minha. É que eu achei que aquelas pessoas que estudaram comigo fossem legais por aquela ter sido uma grande época em nossas vidas. Me enganei feio! São elas as mesmas pessoas que eu sinto que me odeiam, que são indiferentes comigo, enfim... Depois que você não faz mais parte da vida deles, eles sequer mandam alguma resposta de volta. E o que é pior, só eu me sinto assim, só eu sou o desprezado. Não tenho mais ninguém...

            –E a sua família? Onde ela está?

            –Que família? Eles nunca se importaram se eu estava feliz ou não. Sempre fui uma ovelha negra desprezado pelos outros por sentir essas sensações que me impedem de ser como eles. Sempre a mesma coisa, eles me desprezam. Quando entrei na faculdade não tive apoio nenhum, o dinheiro sempre foi pouco, tiveram que fazer sacrifícios para pagar o meu material. Mas nenhum deles perguntou como eu me sentia. Eles queriam que eu continuasse e ainda assim não perguntaram como eu me sentia. Deixaram de lado, todos eles... Sempre tentei ser eu, no entanto, nem eu sei quem sou. Eu queria ser alguém que não existe.

            –...

            –Nem adianta me fazer essa cara de “seja quem você é” que não adianta, eu continuo não existindo. Sou puro faz de conta...

            Akai sai da cozinha comendo biscoitos:

            –Nyaaa! Vou lá fora...

            –Está bem, pode ir... – Akai saiu.

            –E ele? – Perguntou Gurei. – O que me diz dele?

            –Um dia ele vai beber meu sangue e esquecer-se de mim...

            –... – Gurei pensou um pouco. – Não foi você que disse que nunca faria isso?

            –Não entendeu ainda? Sou tão azarado que meu sangue está sempre vertendo pela minha pele quando ela é rasgada pelas minhas escamas... Uma hora uma gota vai terminar de me desgraçar por completo. Este é o dia que mais temo na minha vida...    –Vai ficar parado esperando isso acontecer?

            –E que escolha eu tenho? Só posso continuar meu caminho tentando não lembrar que um dia as coisas que tanto gosto vão quebrar e as pessoas que eu tanto amo não vão morrer.

            –Você está fudido!

            –Uma hora esta mão que finge que me afaga, que finge que isso me basta, vai perceber que eu nunca vou ser feliz de verdade, que eu nunca vou ser completo, que pra mim tudo me faz infeliz...

            –...

            –Uma hora vão se cansar de mim e se livrar de uma vez por todas deste brinquedo quebrado. Só posso esperar que isso aconteça... Nada mais.

            Gurei se levantou, se espreguiçou como bom gato e disse:

            –Vamos arrumar o bar, já está quase na hora de abrir.

            –Sim...

terça-feira, 1 de maio de 2012

Devil's Drink - 7# Shot

            O segundo neko que trabalha na Toca dos Gatos se chama Gurei. Ele foi um dos nekos que mais teve problemas com seres humanos. Maltratado ao extremo, tornou se um neko frio e antipático, sempre pensando no pior. Ele odeia os seres humanos, pois foram eles que arrancaram o seu olho direito...

...

            –Tem certeza disso? Eu preciso... Os nekos precisam de alguém que fique aqui para protegê-los caso a vila dos gatos seja invadida. – Perguntou o dono do bar.
            –Eu já me decidi... Eu sou apenas um estudante de Arquitetura. Eu não sei cuidar de gatos... – En’hain estava dando papinha para Akai que naquela altura já estava todo lambuzado.
            –Eu não vou forçar você a decidir nada. Mas fique certo de que no momento em que você atravessar de volta pela barreira do silêncio para o mundo humano, você vai esquecer-se de tudo que viu aqui...
            –... – En’hain queria voltar, mas também queria ficar e cuidar de Akai.
            –Eu preciso sair... Quando eu voltar quero que todas as suas coisas estejam arrumadas e você esteja pronto para partir. Você vai essa noite. – O dono do bar abriu a porta e já ia sair. – Eu já volto.
            A porta fechou. En’hain foi invadido por um grande pesar. Não queria pensar naquilo, mas era inevitável, queria chorar, se segurava apenas para não preocupar o baixinho que poderia perceber e tornar aquilo muito mais difícil. Alguém bateu na porta:
            –Será que o dono do bar esqueceu alguma coisa? Vou lá ver. – En’hain levantou-se e abriu porta. – Meu Deus!
            –Gunshin?! Preciso de sua ajuda... – Era um neko completamente sujo, diversos arranhões, machucados e um tapa-olho no lado direito do rosto.
Seu estado era deplorável. Não deu muito tempo, gemeu alto e desmaiou, caindo em cima de En’hain:
–E agora? O que eu faço?! – En’hain sentiu que não tinha muita escolha e o levou para o palco, pegou algumas cobertas para confortá-lo e trouxe alguns remédios para seus machucados. Abriu o algo etílico, virou o vidro para umedecer um pouco de algodão e tentou passar nas feridas do neko. Aquilo lhe parecia estranho, era como machucar ainda mais o coitado que gemia toda vez que lhe era passado o álcool na pele aberta.
            Subitamente, o neko segurou fortemente seu braço:
            –Por favor, Gunshin, mate-os... mate-os humanos! – En’hain se assustou e assim que o neko amoleceu a mão por causa das dores, rapidamente ele se afastou do enfermo. – Por favor, você precisa matar todos eles. Sei que você tem poder para isso...
            –Eu não sou Gunshin... – En’hain olhou de lado.
            –Você não é o dono deste bar?
            –... – En’hain não sabia como colocar aquilo em palavras. – Não, o dono saiu agora a pouco.
            –Nyaaa! – Akai se soltou de sua cadeirinha e veio ver o que En’hain estava fazendo, trazendo consigo um biscoito.
            –Akai, você devia ficar na sua cadeirinha! – Akai subiu em En’hain e foi até seu ombro para comer o biscoito. Achava que ali era um bom lugar para ver o que estava acontecendo.
            –Você tem um neko? – Perguntou o estranho.
            –Meu nome é En’hain... É, acho que eu tenho sim, ele não me larga de jeito nenhum...
            –Se você der seu sangue a ele, ele nunca mais vai querer te ver na vida...
            –QUÊ?! – En’hain não sabia que isso podia acontecer. – NUNCA QUE EU FARIA ISSO!
            –Nossa. Não grita. Agora até meus ouvidos estão doendo.
            –Me desculpe... Você ainda não disse seu nome.
            –Meu nome é... – O neko se sentou na beira do palco. – Meu nome é Gurei.
            –Bem... Gurei?
            –Sim...
            –Deixe-me terminar os curativos, sim?
            –Não precisa, deixa que eu mesmo os faço. – Seu tom era frio e ríspido.
            En’hain pegou os remédios e os deu para Gurei.
            –Me diga, En’hain, se você não é o dono do bar, você também não é humano, é?
            –Eu era... Esse tal Gun-sei-lá-o-quê que você disse dividiu seu sangue real comigo e despertou meu lado draconiano adormecido.
            –Draconianos! – Disse com tom irônico. – Vocês sempre prometem ajudar a todo mundo, mas no fim não ajudam ninguém!
            –Como assim? – En’hain estava confuso.
            –Você não sabe por que não existem outros draconianos neste planeta não é?
            –Não... – En’hain sentiu uma indireta.
            –Bem, os draconianos são famosos por ter um coração grande demais para caber no peito. O que significou sua extinção por causa dos humanos ambiciosos que arrancavam seus corações para tentar usufruir de seus poderes mágicos. Apesar disso, os draconianos não são naturais do planeta. Eles são viajantes estelares que procuram levar a paz ao universo. Combatendo o mal com seus poderes terríveis...
            –Oh! – En’hain estava alegre com aquela história.
            –Você não tem a menor ideia dos poderes que realmente tem, não é?
            –Nem um pouco...
            Gurei estendeu a mão e pegou Akai. Admirou-o por um instante... e começou a apertá-lo!
            –Nyaaa! – Gemia o bichinho.
            –SOLTA ELE! – En’hain estava ficando preocupado. – SOLTA ELE AGORA!!!
            –Por quê? Ele não é só um brinquedinho que te incomoda?
            –Nyaaa!!! – Gurei apertou mais ainda.
–EU JÁ DISSE PARA SOLTAR ELE, PORRA!
            –Se eu matá-lo, vou estar livrando ele de todo mal que a humanidade pode fazer a ele.
            –SOLTA AGORA!!!
            –Nyaaa!!!
            En’hain não aguentou a pressão, seu espírito draconiano se agitou, suas escamas e espinhos rasgaram sua carne mais rápido do que nunca, seus olhos já estavam vermelhos. Fez crescer um espinho na palma da mão e o apontou para Gurei:
            –OUSE-SE MATÁ-LO E EU TE ESTRAÇALHO AQUI E AGORA!!! – Seu tom de voz era horripilante, um verdadeiro demônio.
            –Resolveu mostrar sua verdadeira face... – Gurei parou de apertar Akai e uma energia verde brilhou de suas mãos, curando o pequeno neko. – Elemento VIDA, poder de cura!
            En’hain se acalmou e pegou Akai nos braços, aos prantos:
            –Vai ficar tudo bem agora... Vai ficar tudo bem agora...
            –Que comovente! – Novamente o tom de ironia e indiferença.
            –O que foi que eles te fizeram? O que foi que ELES TE FIZERAM?!!!
            –Eles? – Gurei tirou o tapa-olho. – Arrancaram meu olho!
            –... – En’hain cerrou os olhos, encarando Gurei. – Isso não é motivo...
            –Você nunca vai entender, não é? Se eu tivesse o poder de um draconiano, não haveria mais nenhum humano vivo na face da terra! – Gurei fazia gestos doentios, como se apertasse o planeta inteiro em suas mãos.
            –Akai não merecia isso...
            –Nyaaa?! – Akai havia acordado e estava mais esperto do que nunca.
–Akai, seu gatinho bobo... – O neko pulo dos braços de En’hain e foi pra cozinha. – Aonde você vai bichinho safado!
–Agora até ele tem medo de mim... – En’hain olhou para Gurei com um olhar assassino.
Akai voltou da cozinha com um biscoitão nas mãozinhas e o ofereceu a Gurei:
–FOME? Nyaaa!
–Mas, hein?! – Se perguntou En’hain.
–Haha... Que gentileza a sua, coisinha. – Gurei sorriu.
–Você deveria sorrir mais vezes... – Disse En’hain.
–Ué? Por quê?
–Você tem um sorriso lindo...
–...!

...

 Mais tarde naquele dia...

            –Cheguei! En’hain, você está pronto?! – En’hain foi receber o dono do bar.
            –Bem vindo de volta!
            –En’hain, você não vai?
            –Eu não vou...
            –Tem certeza? – En’hain olhou para Gurei que acabou dormindo em cima de uma mesa com Akai dormindo em cima dele.
            –Absoluta! – En’hain sorriu.
            –Que bom... – O dono do bar sorriu.